1.
No actual contexto, não basta à esquerda lutar contra as polÃticas devastadoras da troika com as quais todos os trabalhadores têm sido violentamente atacados nos seus direitos e nos seus rendimentos. Portanto, todos nós à esquerda concordamos (e bem) que a raiz das actuais dificuldades que os trabalhadores atravessam está nas polÃticas que a troika e o governo têm executado. À justa crÃtica juntam-se propostas legÃtimas de tentativa de dar resposta à situação. Uma delas defendida cada vez com maior abertura no PCP é a saÃda do euro e a devolução da soberania nacional a essa entidade mÃtica que é o “PaÃs”.
Mas aqui coloca-se uma questão: só porque se apresentam contrárias à troika, terão os trabalhadores de aceitar algumas delas como justas e benéficas? Apesar de serem contra a troika teremos de as aceitar benévola e acriticamente em nome de uma grande coligação nacional? Bastará uma alternativa ser viável em termos de superação do actual estado de coisas só porque se afirma contra a troika? O juÃzo crÃtico e reflexivo terá de ficar suspenso só porque algumas alternativas se apresentam contra a troika?
A luta contra a austeridade tem de prosseguir e, sejamos claros, tem de crescer. E tem de crescer com mais gente nas manifestações, nas greves, nas concentrações e sobretudo com mais luta nos locais de trabalho. Mas a luta contra a troika não pode desenvolver-se acriticamente e assinar cheques em branco a pretensas alternativas que, no meu modo de ver, resultariam num aprofundamento dessa mesma austeridade.
Quando o governo e a troika nos querem cortar um braço a resposta da esquerda tem de ser a de propor uma alternativa que corte primeiro o esquerdo? Eu prefiro pensar que há alternativas ao corte de um (o que vivemos actualmente) ou de dois braços (se sairmos do euro). É disso que se trata.
Sair do euro é querer apagar o fogo que nos está a queimar com mais gasolina em cima.
2.
Com o intuito de contribuir para o debate polÃtico publico aqui excertos da primeira parte (publicada integralmente no site Passa Palavra) de um artigo da minha autoria. Esta primeira parte assenta fundamentalmente numa crÃtica ao texto que o economista Octávio Teixeira (OT) publicou há umas semanas no jornal Avante! onde o autor defendia abertamente a saÃda do euro. Verdade seja dita, trata-se de uma rara discussão do assunto em termos económicos por parte de alguém do PCP. Todavia, como procurei demonstrar, existem equÃvocos e contradições no artigo desse autor. Na segunda parte deste artigo, a publicar na próxima semana, abordarei outros aspectos tais como as consequências económicas e sociais a nÃvel europeu no caso de uma saÃda grega e portuguesa do euro e os efeitos polÃticos de uma fascização europeia nesse cenário.
«Octávio Teixeira defende que “uma desvalorização de 30% geraria uma inflação da ordem dos 8/9%” no caso de uma saÃda portuguesa do euro. Sabendo que o salário médio em Portugal terá caÃdo algo em torno dos 8% em três anos, seria interessante que OT e os defensores da saÃda do euro dissessem a todos os trabalhadores, que têm sofrido fortes rombos no seu poder de compra com as actuais polÃticas de austeridade, como iriam viver com uma redução salarial de 30% e com uma inflação de 8 a 9%. Portanto, à já de si enorme redução salarial por via da transição do euro para uma moeda nacional, somar-se-ia uma inflação entre 3 a 4 vezes superior à actual.
(…)
A tese de que o aumento da competitividade por via da desvalorização cambial resultaria num aporte de excedente passÃvel de ser aplicado numa reindustrialização do paÃs é muito contraditória nos seus fundamentos. Neste ponto gostaria de pedir o máximo de atenção ao leitor. Por um lado, OT parece esquecer o ponto de partida de algumas das caracterÃsticas da economia portuguesa, tal como enunciei nos itens a) a e) [a) Portugal importa anualmente mais de 50% de produtos com alta e média-alta intensidade tecnológica; b) as exportações intra-comunitárias estavam nos 74% em 2011; c) Portugal tinha um «passivo externo lÃquido em 2011 correspondente a 195,8 mil milhões de euros (109% do PIB); d) a balança corrente registou entre 2005 e 2011 uma perda acumulada equivalente a 55,67% do PIB; e) a formação bruta de capital fixo tem vindo a diminuir significativamente ao longo dos últimos anos]. Ou seja, não basta dizer que Portugal iria tornar-se numa economia competitiva, como faz OT. É preciso tomar em linha de conta os débeis pontos de partida ao nÃvel da produtividade, do investimento e do financiamento externo, que tornam a saÃda nacionalista uma via suicidária.
Por outro lado, e é aqui que se reflecte o outro aspecto da contradição do argumento de OT, a referência que o autor faz à s matrizes de input-outpute os resultados a que chega partem do pressuposto de uma economia estática; ou seja, considera que as actuais necessidades do paÃs continuariam a ser as mesmas nesse processo de reindustrialização. Temos assim um fenómeno contraditório, onde o débil ponto de partida da economia portuguesa não é equacionado (nem é sequer viável) para um futuro de industrialização nacional e onde, por outro lado, essa industrialização futura é tomada como uma decorrência das necessidades de financiamento da actualidade.
Entretanto, tomemos como hipótese teórica que seria possÃvel industrializar a economia portuguesa fora do euro. Aliás, é essa a hipótese colocada por OT. Neste capÃtulo, parece-me que OT não toma em linha de conta que as necessidades de financiamento de uma polÃtica nacional(ista) de reindustrialização são muito superiores à s já actualmente existentes. Ora, se, como OT diz, o paÃs se teria de reindustrializar fora do euro, como isso seria possÃvel aumentando ainda mais as necessidades em outputs provenientes do exterior? Ou seja, se o resultado da saÃda do euro seria uma subsequente industrialização, como a actual economia portuguesa poderia arrancar para uma onda de reindustrialização, se o ponto de partida se encontra sustentado num passivo externo lÃquido que ultrapassa os 100% do PIB e numa baixÃssima produtividade? Repare-se que não se está aqui a discutir por parte de OT uma via de maior integração económica europeia e de, por exemplo, transferência de fundos para um reinvestimento produtivo na indústria instalada e a instalar em Portugal. Pelo contrário, o cenário equacionado por OT – a saber, uma reindustrialização num paÃs acabado de sair de uma zona económica internacional – necessitaria de um volume de financiamento maciço e muitÃssimo superior ao da actual situação.
Uma reindustrialização na base da mais-valia relativa seria impossÃvel nestas condições, por duas grandes ordens de razões:
Por um lado, o financiamento externo em euros ou dólares para a compra de maquinaria de alta intensidade tecnológica, de matérias-primas e mesmo de alimentos e produtos de consumo corrente seria muito mais caro, fruto da desvalorização cambial do escudo. A isto somar-se-iam taxas de juro elevadÃssimas nos mercados de dÃvida. Se a economia portuguesa na actual situação já tem pouca credibilidade internacional junto dos investidores, sem o euro como a segunda moeda de reserva mundial e sem o Banco Central Europeu como entidade de garantia de última instância, a situação seria ainda pior do que já é hoje. No entanto, a via preferida pela esquerda nacionalista não seria esta, mas a da emissão nacional e “soberana†de moeda nacional. Com efeito, a via da emissão de moeda para compensar essa ausência de crédito externo elevaria a já mencionada taxa de inflação de 8-9% a nÃveis estratosféricos, o que só contribuiria para desacelerar ainda mais a actividade económica. OT fala numa inflação de 8 a 9% no caso de uma saÃda do euro e tomando como base a emissão de moeda nacional para cobrir os actuais gastos do Estado e actuais necessidades de financiamento da economia. Na realidade, isto não bate certo com a sua proposta de reindustrialização fora do euro. Se o paÃs se reindustrializasse fora do euro e sem acesso aos mercados de dÃvida pública, a verdade é que, por exemplo, a necessidade de incrementar a compra de maquinaria de alta e de média-alta intensidade tecnológica e a reestruturação do parque industrial português exigiriam somas imensas de emissão de moeda. O que, por seu turno, se reflectiria numa inflação muito superior aos tais 8 a 9% de que fala OT. Portanto, não só o acesso aos mercados financeiros seria inviável como a emissão maciça de moeda nacional não poderia corresponder a uma alternativa economicamente sustentável.
Como esta reindustrialização numa base de incremento da produtividade do trabalho se tornaria impossÃvel, a saÃda só poderia ser uma: o aprofundamento do actual empobrecimento dos trabalhadores por via da redução da massa salarial e numa escala muito superior, pois só assim se elevaria o excedente económico passÃvel de financiar uma polÃtica de reindustrialização. Por isso, a saÃda do euro não representaria o fim da austeridade mas o seu aprofundamento.
É evidente que não estou aqui a descartar as responsabilidades das polÃticas económicas seguidas nas últimas décadas (tanto ao nÃvel nacional como europeu) e o seu impacto neste processo. O que me importa é interrogar os senhores que defendem uma saÃda unilateral do euro sabendo que é com estes dados que se cose a realidade económica portuguesa. Ou seja, se a economia portuguesa já tem dificuldades estruturais profundas ao nÃvel do baixo investimento produtivo com alto valor económico agregado, com um enorme saldo negativo acumulado na balança corrente e na balança comercial, com um passivo externo lÃquido colossal e com uma concentração de ¾ das suas exportações na União Europeia, tendo tudo isto em conta, como seria possÃvel enxergar um desenvolvimento autónomo e autocentrado?
Não se trata apenas de constatar que a estrutura económica portuguesa está configurada de modo totalmente contrário a uma saÃda do euro. Trata-se também de reafirmar as interrogações apontadas no inÃcio deste artigo e que venho fazendo há mais de meio ano: Por que os defensores de uma saÃda do euro quase nunca apresentam dados económicos? Por que os defensores de uma saÃda do euro omitem uma reflexão profunda e detalhada sobre as caracterÃsticas da estrutura económica portuguesa? Por que os defensores de uma saÃda do euro propõem uma via económica totalmente contraproducente para as já de si deterioradas e precárias condições de vida dos trabalhadores portugueses? Por que nunca publicaram até hoje um estudo económico detalhado e sistemático em defesa das suas propostas? Para um assunto desta importância e com os impactos que iria ter, não deixa de ser bizarro o facto de que quem mais tem apresentado elementos para um debate objectivo e sério sobre o assunto sejam os que se opõem a uma deriva nacionalista. Ou, para ser mais exacto, se calhar até nem será bizarro de todo, se tomarmos em consideração que o nacionalismo vive no plano da ideologia e que os propósitos conscientes e inconscientes dos defensores desta via estão longe de se sustentar no plano da realidade».
Boa tarde, JVA
Parabéns pelo texto.
Iria jurar que há vários estudos do João Ferreira do Amaral sobre o assunto. Que desdramatizam a saÃda do Euro. Se o JVA vivesse na Grécia, talvez escrevesse o texto de maneira diferente. Mas é um bom ponto de partida. Porque o que interessa é perceber se no quadro da Zona Euro teremos as ferramentas necessárias para nos desenvolvermos. E temos ? Não vejo aonde. Logo, não será esse o caminho. Se não é o caminho, há que enveredar por outro. E convém que seja discutido, ao contrário do que se fez com o processo de adesão à moeda única.
Outro ponto: a esquerda de que fala não é nacionalista; é patriótica. Há diferenças …
Abraço
“…não é nacionalista; é patriótica.”
Eu diria: patrioteira.
Os textos do João Ferreira do Amaral são naturalmente interessantes mas do que conheço de um “dossier” que o João Rodrigues colocou aà há tempos no Ladrões de Bicicletas são textos fundamentalmente conceptuais e com pouca empiria apresentada e partem da tese de que a moeda única só faz sentido no caso de economias homogéneas. Se assim fosse como o dólar poderia ser aplicado nos EUA com estados tão dÃspares como o Nebrasca ou a Califórnia, ou a China com o yuan com as diferenças entre o Tibete, o Sinquião e a zona de Xangai…
Um excelente texto que mostra, mais uma vez, que uma certa pequena-burguesia esquerda intelectual se constitui no melhor instrumento de defesa dos interesses do grande capital financeiro, no caso alemão, que usa o euro como instrumento de dominação e de espoliação dos povos europeus, e da burguesia financeira indÃgena sua subsidiária. Trotskistas, e não só, confundem internacionalismo proletário com globalização capitalista, luta anti-imperialista com nacionalismo burguês e socialismo com capitalismo de estado – é uma chatice nacionalizar (estatizar) a banca porque traz a ditadura do capitalismo de estado! Os Ricardos Salgados e Ulrichs agradecem.
O BÃRBARO
Você sabe lá o que é a pequena-burguesia para se escudar ao debate dessa maneira… Que calidade de argumentação…
De acordo com o Miguel Andrade e o Bárbaro.
O JVA defende…que devemos poder escolher a árvore em que nos vamos enforcar. Para ele, parece, pior do que o afundamento do paÃs, o alastrar da fome, da doença, do extermÃnio dos pobres, da acção dissolvente desta polÃtica em todos os domÃnios, a que diariamente assistimos; é o poder ser confiado aos comunistas, essa raça de alienÃgenas, essa gente que não integra o beautifull people.
«O JVA defende…que devemos poder escolher a árvore em que nos vamos enforcar»
Você devia aprender a ler o que está escrito no meu texto. O que eu disse é que não temos de escolher nem a forca da troika nem a forca da saÃda do euro. Pelo contrário só a luta contra a austeridade dentro do quadro europeu faz sentido para que a médio-longo prazo se possa, aà sim, superar a união europeia capitalista.
BE=SYRIPAS=PT do Lula e tutti quanti maffiosi.Eu deixei de votar no BE e,o sr. dá-me razão!Vai-te!
‘Comprimentos’ ao Zé…
BE=TSYRIPAS=PT do Lula e tutti quanti maffiosi!jà DEI PARA O SEU PEDITÓRIO.BE,NUNCA MAIS!’COMPRIMENTOS’ Ao Zé que faz falta,ao eurodeputado RuiTavares.Se fossem comunistas, diria que são Trotskistas mas,como nãao fazem o favor de nos não dizer qual a famÃlia ideológica a que pertencem,supõe-se que são um apêndice da ‘socialdemocracia’,animais amestrados da plutocracia-o syripas,como todo o mundo sabe aumentou a votação graças ao eleitorado ‘socialista’ q se identificou desde logo.A mim,não me enganas!Vai-te!
Obrigado por esta sua lição de teoria polÃtica. Ficamos todos esclarecidos quanto à s suas qualidades.
Obrigados,Valente!Do seu brilhante artg fiquei a saber q 75% da chamada DÃvida Pública é Divida PRIVADA e que estamos a pagar prós bancos.Chama-se a isso de Rigor,Competência e Responsabilidade!É Sasrcasmo,só pode ser.BE,fraquinhos,muito fraquinhos e oportunistas.A vossa ideologia, de que não dão notÃcia, é a mesma de todos oportunistas.
Eu não sou do BE mas ao menos o BE não comete a insanidade (pelo menos do que sei do que li do Francisco Louçã) de defender a saÃda do euro.
Quanto a mim posso dizer que sou um idealo-pragmatista da variante Shangai strengthening the Commune centenário de Paris. Também gosto muito das teorias do Mohammed Levinski Allez. Yah, é isso
Caro João,
parece-me que há quem confunda “derrotar o euro” e, se possÃvel, balcanizar a Europa, com lutar contra as forças do capitalismo austeritário. Uns confundem as coisas, tanto quanto posso avaliar, de boa fé; outros, o que visam é criar condições geoestratégicas mais favoráveis ao mdelo de sociedade que defendem e os faria subir na hierarquia partidário-estatal (refiro-me a um modelo do tipo “socialismo realmente existente” na ex-URSS – mormente nos gloriosos tempos de Estaline – e hoje na RPC ou, vá lá, em Cuba, “socialismo” do qual, ao que parece, são “companheiros de jornada” o Irão hoje, como ontem a LÃbia de Kadhafi).
Ora, acontece que travar e derrotar a ofensiva do austeritarismo capitalista é mais exequÃvel juntando os trabalhadores e cidadãos comuns da zona euro e da UE do que partindo a região aos bocados, em Estados capitalistas militarizados e de coloração, quando não essência, fascista, que imporão um regime de quartel ao conjunto da sociedade, a começar pela direcção da economia. Quanto a dizer que a UE é “irreformável” e por isso não deixará que as condições melhorem na região portuguesa, e supor que estas poderiam melhorar no contexto de uma conjectural dependência, rebaptizada de solidariedade, de potências emergentes como a RPC, Angola ou o Brasil, é ou querer enganar a malta ou alimentar uma predisposição inquietante para acreditar que a água nasce nas torneiras (com a devida saudação ao Alexandre O’Neill).
Excelente o esforço de elucidação e de “mergulhar de olhos abertos” (com a devida saudação à memória de Sophia) dos excertos que aqui deixas do teu ensaio em publicação no Passa Palavra.
Abraço
msp
MSP: Pois, eu que sou comunista, vejo em Cuba um mal menor. Da mesma forma que vocês preferem uma Europa sob o jugo da austeridade a vê-la novamente dividida (como se sair do Euro ou não pagar a dÃvida implicasse que a europa ficasse “dividida”) eu prefiro que Cuba tenha uma existência miserável como tem, do que tenha uma existência miserável que se pode ver em qualquer um dos paÃses seu vizinho nas CaraÃbas.
«vocês preferem uma Europa sob o jugo da austeridade a vê-la novamente dividida»
Ah, então é esse o objectivo… O problema não é a europa dividida mas a divisão que isso levaria aos trabalhadores europeus.
«eu prefiro que Cuba tenha uma existência miserável como tem».
Como dizem os brasileiros, parabenizo você pela sua honestidade. A miséria é aceitável se tiver foices e martelos a acompanhar.
Do meu comentário apenas se depreende que a miséria cubana é aceitável se a outra opção for a miséria capitalista que existe fora dos resorts nos paÃses vizinhos caribenhos.
Para mim é claro que a via inaugurada com a revolução Cuba, ainda que nacionalista, fez muito pelo internacionalismo proletário. Reparem, eu com isto não quero tirar mérito à vossa linha de pensamento. Tomara que mais gente tivesse tempo para vos ler, para ler os clássicos, para ler sobre História, para se instruir no sentido de se tornar um revolucionário consciente do papel da classe trabalhadora, fora de um quadro de nacionalismos e de patriotismos. Mas visto que nem a consciência de classe nem o internacionalismo estão presentes na ideologia da esmagadora maioria dos cidadãos europeus ou (quanto mais do resto do mundo), nem que essa iluminação vai aparecer com o aprofundar da crise, parece-me que aquilo a que vocês chamam “nacionalismo” (a meu ver erradamente), a curto prazo pode ser uma via. Não esqueçamos que o Ché morreu longe de Cuba.
Fernando,
o que eu não compreendo é por que razão Cuba escapará mais facilmente à sorte monstruosa reservada à maioria da população nos paÃses que V. se refere através de um regime ditatorial. Não aceito que a miséria seja alternativa à miséria, que a ditadura seja alternativa à ditadura, que a servidão material e ideológica seja alternativa à servidão material e ideológica. E, mais ainda, como escrevi aqui há dias, comentando outro post do JVA, entendo também o seguinte:
“João,
pego na tua pergunta certeira — “A questão que se coloca é: é toda a esquerda que se diz anticapitalista realmente anticapitalista?” —(…) e adianto um começo de resposta.
O que penso é vai sendo mais do que tempo de dizermos bem alto, e de tirarmos as consequências disso em vista da acção, que para ser anticapitalista a luta tem de começar por ser democrática (tanto nos seus objectivos como na sua organização, ou regime que instaura), e que o grau de anticapitalismo de um movimento se mede pela democratização que instaura por onde passa e está, a começar pelas suas próprias fileiras”.
Vale?
msp
“…como a actual economia portuguesa poderia arrancar para uma onda de reindustrialização, se o ponto de partida se encontra sustentado num passivo externo lÃquido que ultrapassa os 100% do PIB e numa baixÃssima produtividade?”
resposta:
Suspendendo imediatamente o pagamento e uma dÃvida que é odiosa e, depois de uma auditoria, metendo na cadeia umas centenas de responsáveis pelos endividamentos criminosos dos bancos e privados que, como JVA sabe certamente, foram (e continuam a ser) transferidos como ónus para dÃvida pública – o que é completamente ilegÃtimo!
Acho que o JVA confunde as noções de “discutir”(debater) com “aprofundar conhecimento”.
Nada contra o “aprofundar do conhecimento” sobre as consequências económicas de uma “discutÃvel” orientação polÃtica. Espero é que não acabemos a “discutir” economia! Porque é isso que transpira este artigo. O politica subordinada ao económico. “O rabo a abanar o cão”.
Politica e económicamente o que está errado nesta suposta pretensão europeia de integração é-o no seu cerne. No modo como a decisão politica é tomada e a precisão cientifica com que instrumentos económicos servem a mesma. A decisão polÃtica de subjugar os povos europeus subtraindo-lhes a soberania económica. Não estamos perante obra do acaso ou insuficiencia cientifica para debelar os problemas que nos são visÃveis. Estes são meramente a consequência previsÃvel “by the book”!
A saÃda do euro não se impõe por dúvidas ou polémicas ora economicas ora polÃticas, impôe-se não por constituir uma mera “alternativa” à ordem vigente, impõe-se porque a ordem vigente nunca foi um legÃtimo caminho polÃtico, alguma vez, quanto mais uma solução económica para o servir.
Quando se ensaiou em França a lei de 3 de Janeiro de 1973 impedindo o Estado Francês de se auto-financiar (lei de Rothschild), quando a lei “tipo” se espalhou pelos paÃses europa fora, quando (1992) Maastricht a consagrou… (em Portugal foi o Presidente Mário Soares e o PM Cavaco Silva em 1989 que alteraram a Constituição), foi disparado o gatilho! E não foi um disparo nada acidental.
A austeridade “hoje” é mentira! A bala económica já descreve a sua trajectória genocida desde as datas acima. A questão não é se nos levam “um braço” ou “dois braços” JVA, a questão é se nos desviamos da bala a tempo.
Quais serão as consequências práticas de tal decisão polÃtica em sair do euro?
Pois entre a garantia de uma polÃtica europeia genocida a curto-médio-longo prazo, não importa, prefiro indubitávelmente nem que seja a mera eventualidade de lhe escapar, se pelo caminho se reconquistar um pouco da dignidade que nos foi subtraÃda enquanto povo, e bastar-me-á o abrir-se a possibilidade de não ser alvo do genocÃdio.
E mais: essa do espantalho duma união europeia em retaliação fascista contra um povo que se auto-determine não pega, primeiro porque só tem medo quem desconhece, depois porque já se lhe vê a fuça todos os dias!
É como se o JVA prossupusesse boa-fé polÃtica onde ela demonstradamente não existe, onde nunca existiu, o JVA não será tão ingénuo.
Parecendo natural, e até recomendável, nos termos em que o coloca, o argumento do JVA redunda no de se remediar economicamente os 40 anos de politicamente irremediável, não só erra na ciência do problema verdadeiramente em causa como nos sugere confinar a discussão das “alternativas” ao meramente económico. E enquanto debatemos levamos com o balázio… Para isto não estou disponÃvel!
E esse rótulo de “nacionalismo” a quem defende a opinião contrária à sua, JVA, cai mal para quem aparentemente só deseja honestamente debater as suas dúvidas.
já respondi abaixo ao RMS sobre o que penso do nacionalismo.
Sobre o restante. Várias das suas interpelações serão, espero, respondidas na próxima semana. Mas só uma nota. Grande parte da esquerda partiu sempre do pressuposto que uma crise capitalista desembocaria numa eternização da barbárie capitalista. Ora, o sucesso do capitalismo é a sua capacidade para depois da desvalorização de valor no quadro das crises relançar a economia e sobretudo relançar a produtividade em novos moldes com a correlativa melhoria das condições de vida. Claro que o capitalismo consegue isto porque demonstra uma capacidade imensa de apropriação das lutas e práticas inovadoras operárias e depois de (infelizmente) derrotadas essas lutas as tornar em novas práticas de produção de novas mercadorias. Ora, esquecer que a modernização capitalista está sempre ao dobrar da esquina enquanto os trabalhadores não conseguirem derrotar as classes dominantes é estar sempre a cair no erro que muitos marxistas cometeram perante o fascismo dos anos 20 e 30 quando achavam que o fascismo era a última fase do capitalismo e que este seria incapaz de se remodelar e de aumentar a exploração económica. Viu-se… A inocência e o desejo desfasado da realidade pagou-se caro.
João, desde que te tornaste o novo educador das massas oprimidas que as tuas respostas a quem discorda contigo são muito interessantes.
Tu és contra e eu nada tenho contra isso. É legÃtimo. Eu discordo. Também é legÃtimo. Quanto a mim, a questão é muito simples: acreditar que é estando no euro que vamos superar todos os défices que enuncias acima e reindustrializar o paÃs é de uma bondade que sistema actual não tem.
Quanto a possÃveis consequências – porque não são certezas – que apontas, não é assim que estamos já?
De resto, não acredito que não percebas a diferença entre nacionalismo e patriotismo. E o facto de eu saber que tu percebes torna-te faccioso.
Nunca fui nem pretendo ser educador de massas nenhumas. Pelo contrário, até me podem acusar de ser “basista” demais. Ou seja, são o que chamas de massas que fazem a história e não eu ou apenas as vanguardas (apesar destas existirem).
Sobre a desindustrialização. Escrevi no texto isto :«não estou aqui a descartar as responsabilidades das polÃticas económicas seguidas nas últimas décadas (tanto ao nÃvel nacional como europeu) e o seu impacto neste processo». Eu não defendo o euro nem as polÃticas de austeridade. Aliás elas tratam de me lembrar todos os dias das suas consequências e a quem servem. O que me interessa aqui debater é o outro ponto: será a saÃda do euro uma real alternativa? Ou a alternativa será o prosseguimento da luta dentro do euro de modo a que a médio-longo prazo mais facilmente os trabalhadores possam chegar ao poder e construir uma outra sociedade?
Sobre o patriotismo e o nacionalismo. Se tu tomares o patriotismo unicamente como uma mera questão de afeição ao local onde se nasce, à comida, até à cultura, ao futebol, etc. não podemos daà retirar que alguém ou algo é necessariamente nacionalista. Mas não é destas “trivialidades” que se discute neste assunto na saÃda do euro, mas o fechamento polÃtico e económico num espaço nacional e pensar-se a luta polÃtica contra o capitalismo nessa base quando o capitalismo é transnacional e quando as lutas dos trabalhadores mais poderosas no passado articularam-se sempre no plano internacional.
A saÃda do euro é sempre uma alternativa real. No entanto, o prosseguimento da luta dentro do euro é inevitável enquanto estivermos no euro. Acreditar que o euro favorece ou sequer facilita a organização dos trabalhadores é demasiado bondoso da tua parte. O euro não facilita o fortalecimento dos trabalhadores enquanto massa organizada e progressista, uma vez que está associado a uma estratégia imperialista de controlo da opinião, como explico no parágrafo abaixo. O euro asfixia os trabalhadores, oprime-os mais acentuadamente do que uma sociedade burguesa porque há quem decida, lá longe, o que pode ou não fazer-se com taxas e o valor das trocas. Ao contrário do que questionas, o euro não permitirá que a “médio-longo prazo mais facilmente os trabalhadores possam chegar ao poder e construir uma outra sociedade”. A existência do euro faz sim com que os trabalhadores queiram sair dele e, então, libertar-se das chantagens económicas dos directórios submetidos a uma moeda que beneficia os paÃses mais ricos.
O euro e o directório que o controla procura, isso sim, fazer crer que para lá do euro só existe a catástrofe. A inflação, as trocas externas, as balanças comerciais. Passamos, no entanto, a ter na mão um instrumento que não temos, que é a desvalorização da moeda. O euro nasceu torto. Uma moeda única em relaidades tão distintas não iria funcionar e toda a gente o sabia, a diferença é que alguns o denunciaram – a inexistência de uma área monetária óptima. Agora que cá estamos, pesemos os prós e os contras.
A luta internacional fez-se e faz-se todos os dias, com ou sem fronteiras – referindo-me à UE – sem esquecer as realidades especÃficas de cada paÃs e da sociedade que o compõe. As aspirações dos comunistas portugueses e dos comunistas do resto da europa são genericamente as mesmas, mas existem particularidades que derivam da heterogeneidade de circunstâncias objectivas que variam de caso para caso. Isto explica o patriotismo e o internacionalismo.
rms,
os problemas que aponta têm origem não no facto de existir uma moeda única, mas no facto de esta só existir pela metade, ou nem tanto, dada a ausência de integração orçamental, fiscal e polÃtica da região.
Ora, se é dificilmente contestável que uma implosão/balcanização da ZE e da UE implicaria um agravamento da austeridade e das condições de vida da grande maioria dos seus cidadãos e do conjunto dos seus trabalhadores, para além do autoritarismo e belicismo que causaria também, parece que o quadro federal é mais favorável a uma via visando fazer recuar o austeritarismo e encetar, aproveitando o balanço, a luta pela democratização. Com efeito, uma integração federal da UE, pelos seus efeitos niveladores inevitáveis, tornaria mais fácil a percepção pela grande maioria dos cidadãos da Europa a comunidade de interesses e de obstáculos, dificultaria as manobras de divisão dos trabalhadores da oligarquia governante, propiciaria a junção de forças e a unidade de acção em torno de metas comuns mais imediatamente identificáveis. Enfim, seja como for, e seja para os trabalhadores e para a grande maioria dos portugueses, seja para os trabalhadores e grande maioria dos outros cidadãos europeus, a luta contra a austeridade e as tentativas de absolutização da dominação capitalista tem mais oportunidades de ser bem sucedida e de se aprofundar numa Europa federal, e orçamental e fiscalmente integrada, do que no regresso à s mÃticas soberanias plenas.
Tudo isto significa que o euro funciona como instrumento da polÃtica austeritária por, ao mesmo tempo que já não é uma moeda nacional, não ser ainda suficientemente uma moeda única – como o dólar, por exemplo. E, a propósito, repare que ninguém se lembrou ainda de propor que a luta anticapitalista nos Estados Unidos deva ter como objectivo primeiro, ou primeiro passo estratégico, a ruptura de cada Estado federado com o dólar, em vista de recuperar a sua soberania. Por isso, embora pense que a adopção do euro sem uma integração federal concomitante conduziu a impasses de todo o tipo, penso também que a saÃda unilateral do euro pelas razões que indiquei acima seria um remédio pior do que o mal, tanto para as grande maioria dos portugueses como para o conjunto dos trabalhadores e cidadãos da ZE e da UE, e tornaria ainda mais difÃcil a luta contra a austeridade e pela extensão das liberdades e direitos à escala da região.
msp
Nota para o senhor “Economista” que queria colocar neste espaço um comentário ofensivo sobre a minha pessoa: calúnias e mentiras sobre mim não serão aqui publicadas. Se não percebe ou não tem conhecimento das regras da boa educação não sou eu que tenho de lhe ensinar.
É de facto bizarro que eu esteja assim tão errado para que você e alguns outros se dediquem a perder tempo comigo. O que só demonstra que o que eu e outros temos escrito sobre este assunto tem razão de ser e incomoda vários burocratas que aspiram um dia tornar-se pastores do rebanho proletário.
Agora vá, volte lá para de onde veio e aprenda a comportar-se como gente grande e informe-se correctamente em vez de se armar ao aluno que quer amanteigar o professor. Passar bem.
‘entidade mÃtica que é o “PaÃs‒
O resto do texto deve ser engraçado
Foi
Não percebo o argumento. Ora se as já existentes debilidades da economia portuguesa se agravaram com a entrada na ZE, como defender permanência na moeda única devido às debilidades da economia portuguesa?
Eu já disse no texto que é mais do que óbvio que existem responsabilidades das polÃticas neoliberais. E o estado actual de coisas deriva exclusivamente dessas mesmas polÃticas e do facto de a zona euro ter aprofundado uma divisão entre duas zonas: uma altamente produtiva e onde se concentra a aplicação dos mecanismos da mais-valia relativa e outra onde se deixaram esses mecanismos quase parados ou muito mais lentos (vd. tabela que vem no artigo integral no Passa Palavra).
Esperando ter esclarecido este ponto passo ao que me colocou directamente. A situação que temos é a que temos: terrÃvel, abominável, desesperante. O futuro partirá daqui e não do que poderia eventualmente ter sido. Assim sendo com Portugal a ser um paÃs altamente endividado, com uma balança corrente altamente deficitária, com uma importação de bens tecnologicamente avançados (e portanto mais caros) e com uma exportação fundamentalmente de produtos com baixa e média-baixa composição tecnológica, com uma produtividade de menos de metade da alemã, todas estas variáveis não seriam superadas pela simples saÃda do euro. No caso de uma saÃda do euro se se quisesse realmente modernizar o aparelho produtivo ficaria muito mais caro importar maquinaria tecnologicamente avançada. O mesmo para combustÃveis, matérias-primas, etc. Por outro lado, se se quisesse realmente modernizar o aparelho produtivo seria necessária uma quantidade de capital superior à actualmente que as empresas em Portugal vão pedindo emprestado. Ora, fora do euro o acesso aos mercados financeiros estariam fora de questão por razões de foro ideológico mas também práticas. O escudo seria uma moeda de pechisbeque. Mesmo que se conseguissem juros ao nÃvel dos actualmente praticados em que isso iria alterar a actual polÃtica de aumento da dÃvida pública? A outra alternativa seria a emissão de moeda. Ora, um excesso de impressão de moeda nacional resulta necessariamente numa inflação galopante. Por isso é que, entre outros aspectos, uma saÃda do euro me parece totalmente descabida do ponto de vista económico.
Caro,
Dizer que é terrÃvel todos dizem, inclusivamente os nossos governantes, mas não basta. A posição de OT é outra , mais precisa: é o euro que agrava e intensifica a fragilização da economia portuguesa, daà a necessidade de sair. Se se argumenta que a economia está em estado comatoso parcialmente por causa da permanência de Portugal no euro, para defender a manutenção na ZE ou se discorda do diagnóstico (o que me parece manifestamente difÃcil) ou se apresenta um argumento que vai além do estado actual da economia nacional. Mais que as debilidades da economia nacional, este parece-me ser o problema da defesa da saÃda unilateral do euro; apresentam-se propostas e enunciados avulsos não só para a retoma económica mas também para a valorização do trabalho e igualdade social sem se tocar, nem ao de leve, no quadro geopolÃtico de onde este futuro surgiria. Porque não uma saÃda multilateral? Contrapor à europa actual onde é pedido a cada paÃs que faça o seu trabalho de casa (que no final isto bate tudo certo) o orgulhosamente sós da esquerda não me parece, nem de longe, solução para o que quer que seja.
Acho que a questão não é se devemos ou não sair do euro. Acho que essa questão tem sido colocada porque, se em algum momento conseguirmos sair da via austeritária que se abaterá sobre nós durante muito tempo, com toda a miséria que lhe está associada,, eventualmente seremos empurrados para fora do euro. A decisão de sair do euro não é inteiramente nossa. Acho que mesmo continuando na via austeritária eventualmente sairemos do euro. Por isso, parece-me que o melhor que podemos fazer é escolher o momento, como o fazemos e preparar-nos para tal. Acho que grande parte dos argumentos que apoiam a saÃda do euro baseiam-se neste cenário. Portanto, a mim parece-me que a partir de um certo momento vai ser difÃcil exigir a saÃda da via austeritária sem pedir a saÃda do euro com termos próprios. Pois a alternativa seria exigir a saÃda da via austeritária pensando que isso não significa a saÃda do euro, eventualmente forçada.
O que lhe parece João Valente Aguiar?
Ninguém vai empurrar ninguém para fora do euro. Ou melhor a linha actualmente hegemónica só usa isso como ameaça e chantagem, não como objectivo. Eles sabem muito bem quais os custos de tal aventura. E custos esses que seriam pagos pelos trabalhadores e não pelos capitalistas… Voltarei a esta questão na segunda parte do meu artigo que sairá na próxima semana.
Sim, mas num cenário de conseguirmos sair da “lógica” da dÃvida não seremos empurrados, pela Alemanha e França (como representantes dos interesses capitalistas) para fora do euro, como forma de retaliação? E nesse caso como farÃamos? A questão para mim é essa…
A questão é que um fenómeno como o Syriza levaria necessariamente a uma renegociação da dÃvida. Não acredito que quisessem expulsar algum paÃs do euro porque o maior problema da actual crise não é Portugal ou a Grécia mas o facto de uma saÃda do euro de um ou mesmo dos dois paÃses teria consequências devastadoras por toda a Europa. Por isso é que os capitalistas, em princÃpio, ainda não decretaram falência de Portugal e/ou da Grécia.
No actual estado de fraqueza da esquerda, se houver uma derrocada económica quem a pagará serão os trabalhadores. Basta pensar que tal situação estaria ao nÃvel de 1929.
Em relação a esta tua passagem, “Por isso é que os capitalistas, em princÃpio, ainda não decretaram falência de Portugal e/ou da Grécia.”
E quando isso acontecer? E se a saÃda do Euro de Portugal e Grécia for compensada com a entrada de outros paÃses? E se a União Económica for preparada para a saÃda destes paÃses?
Porque é “o maior problema da actual crise Europa” (…) “a saÃda do Euro de um ou dois paÃses” e isso “ter consequências devastadoras por toda a Europa”? Quais, como e porquê?
Cumprimentos,
Ricardo
A segunda parte do artigo a sair em poucos dias tratará dessas mesmas questões.
Cumprimentos
http://www.youtube.com/watch?v=mUsUohxRbSM
ainda não te li João… venho com calma apreender o que deixaste durante o fim (dizem que é da semana quando chega a 6ª, mesmo sem feira – t de tradicional)
Abraço
Caro Joao,
Onde posso encontrar as teorias de Mahommed Levinski Allez? Já procurei no Google mas “zero a esquerda”.
Obrigado pela vossa/tua paciencia e a todos que ainda se dao ao trabalho de nos esclarecer que a meta é a igualdade e nao o euro, o nacionalismo, o patriotismo, os estados-nacoes, ou outros montes de areia que nos atiram para os olhos.
JVA, o OT no artigo dele defende que uma desvalorização de 30% do escudo, conlevaria uma inflação de 8 a 9% e que a desvalorização dos salários reais seria de 8 a 9% (embora ele afirme que tal não seja obrigatório) e não uma desvalorização de 30%, acrescida de uma inflação de 8 a 9%, como tu afirmas que ele diz. Não tendo capacidade técnica para fazer a análise do que tu e o OT dizem, resta-me só assinalar a falha da tua leitura do que é a opinião dele….
Rafael,
aqui vai o que escrevi aà há uns dias sobre o mesmÃssimo assunto noutro sÃtio (http://passapalavra.info/?p=68594):
“eu também pensei inicialmente o que tu dizes mas repara na frase completa: «uma desvalorização de 30% geraria uma inflação da ordem dos 8/9% (reflectindo o efeito do peso das importações na produção e no consumo), o que significaria, embora não necessariamente, idêntica quebra nos salários reais». Eu entendo a ligação da desvalorização com a “idêntica quebra dos saláriosâ€. Uma desvalorização cambial resultaria numa desvalorização dos salários na mesma ordem de grandeza no dia em que saÃssemos do euro (e isto tomando os dados como certos o que não me parece nada crÃvel pois vários estudos internacionais mostram precisamente o contrário como apresentarei na segunda parte deste artigo). O que depois se pode dizer é que essa desvalorização dos salários (dito de modo muito grosseiro 1000 euros passariam a “valer†700) reflectir-se-ia numa igual queda de 30% nos bens de consumo, das rendas das casas, etc. Mas isto é o momento de partida porque logo a seguir para continuar a fabricar bens e produtos em Portugal (e a importar outros) a inflação andaria nesses 8 a 9%. Ou seja a desvalorização nos salários (derivada directamente da desvalorização cambial de 30%) seria acompanhada por uma subida dos preços dos produtos de 8 e 9%. Por isso é que ele diz que o valor da inflação a que chegou reflectiria «o efeito do peso das importações na produção e no consumo». Hoje temos uma inflação entre os 2 e 3%. Tu dirias que a queda dos salários é igual a estes valores? Indo mais longe, tu dirias que a queda dos salários deriva (primordial e direccionalmente) da inflação? Ora, a queda do salário médio em Portugal será de 4,5% para este ano quando a inflação andará a pouco mais de metade disto. Não estou de maneira nenhuma a dizer que não há relação entre taxa de inflação e baixa dos salários. Apenas estou a dizer que não creio que o Octávio Teixeira faça essa ligação tão automática entre ambos os factores.
A questão ali prende-se portanto com uma desvalorização de 30% da moeda que levaria a um embaratecimento das mercadorias (inclusive da força de trabalho) na mesma ordem e que, dada a balança comercial actualmente existente, isso resultaria subsequentemente numa subida dos preços na ordem dos tais 8 a 9%.
Admito que possa ter interpretado mal a frase mas foi isto que me pareceu.”
Acho que o interpretas mal, tendo em conta a compração que o OT faz com a desvalorização dos salários nos ultimos anos, dizendo que são da mesma ordem de grandeza…
Caro João Valente Aguiar,
Já há alguns meses tive oportunidade de lhe deixar um comentário num texto seu, sobre esta mesma questão da Euro/UEM.
É um debate interessante e cada vez mais importante. Um debate que, pela sua complexidade, dispensa a arrogância das certezas certas. Um debate que não pode ignorar ou obnubilar – e esse é um dos erros em que sistematicamente o João cai na abordagem deste assunto – a natureza de classe do Euro. Recordo-me de lhe ter lançado uma pequena “provocaçãoâ€. Aqui a reitero (e se me permitem ambos, estendo-a ao Miguel Serras Pereira): o João (e o Miguel), na defesa do Euro, estão ao lado do grande patronato europeu e das suas organizações de classe (sugiro a leitura do que sobre isto tem vindo a dizer a Business-Europe nos dois últimos anos). É natural. Defendem os seus interesses de classe (a Business-Europe, bem entendido). O mesmo que permitiu comprimir os custos unitários do trabalho e salvaguardar os lucros. Entre 2001 e 2013, os lucros crescerão vinte vezes mais do que os salários em Portugal e cinco vezes mais na Alemanha e no conjunto da Zona Euro (são dados da própria Comissão Europeia). Isto é o resultado do Euro (e não do “austeritarismo†dos dois/três últimos anos, como diz o MSP).
Para Portugal, o Euro significou uma década de estagnação e de agravamento substancial do défice da balança comercial intra-comunitária. Défices que também se agravaram em Espanha, na Grécia e na própria França, entre outros. Como sabemos, à medida que os superávites de outros se consolidaram e cresceram. Isto foi (e é) o Euro e, francamente, não creio que outra coisa possamos esperar no quadro da sua persistência, tirando mais uns quantos programas de ajustamento em nome da sua preservação, que todos já sabemos onde nos levam.
Evidentemente que a saÃda do Euro levantaria também inúmeros problemas para paÃses como Portugal. Problemas que não devem ser ignorados. Aqui reside, na minha opinião, o carácter dilemático da questão. Há que debatê-la seriamente, sem preconceitos nem recorrendo à caricatura e à deturpação. E aqui, sem assumir o papel de advogada de ninguém, manda a verdade que se diga que é o que o PC tem feito. Infelizmente, creio serem mesmo o único partido que em Portugal o tem feito. Já agora, desde o momento da adesão aos dias de hoje, com assinalável lucidez, que gostaria de ver também por outros lados. E creio que não será por acaso que (tanto quanto sei) não defenderam, até à data, a saÃda do Euro. O que têm defendido (e em minha opinião, bem) é uma “dissolução†da UEM. Organizada (tanto quanto possÃvel), evidentemente.
Ao contrário do João, não estou segura de que aqueles que têm beneficado do Euro até agora não venham a apostar numa saÃda de alguns dos PIGS, pelo menos dos mais problemáticos (e caros). Não para já. Mas a prazo. Pelo que creio ter todo o sentido aquilo em que alguns começam a insistir: independentemente das opções do paÃs, há que prepará-lo para cenários de possÃvel imposição dessa saÃda. Uma coisa tenho como certa: a gestão desse cenário seria completamente diferente se feita no contexto de um governo pró-troika ou no contexto de um governo de esquerda (e já agora, “patrióticoâ€, também, como diz o PC; ao João, que insiste na caricatura do “nacionalismo†recomendo um belÃssimo texto que o Manuel Gusmão aqui deixou no 5dias). As medidas seriam forçosamente drásticas, em ambos os cenários. A questão seria no interesse de quem (de que classes, entenda-se) seriam tomadas.
Bom, o comentário já vai longo. Para terminar, deixo para reflexão (quer ao João quer ao Miguel) o exemplo da América Latina. Na enorme diversidade de processos em curso naquela região, há uma questão diria transversal a todos eles (ou pelo menos, aos de conteúdo mais progressista): a importância atrbuÃda à “soberania nacionalâ€. Foi um dos marcos da ruptura com o neoliberalismo. A defesa do “interesse nacionalâ€, identificando-o, naturalmente, com a defesa do interesse da maioria do povo. Ou, se quiserem, associado a “opressão nacional†a uma forma de opressão de classe. Assim segue sendo (passem os olhos pelas constituições de um Equador, de uma BolÃvia, de uma Venezuela ou por aquela que nas Honduras o golpe de Estado não deixou nascer). Mas tal não implicou, bem pelo contrário, posturas isolacionistas: veja-se como vem avançando a integração no continente, sob formas diversas, é certo, mas em qualquer dos casos bem distintas da UE.
Que bom que era que uma certa esquerda tirasse algumas lições daquilo que se passa sob os nossos olhos, em lugar de manter uma fé irracional (passe a redundância) na conversão ao “paraÃso europeu†da UE da “economia social de mercado 
Alexandra
Cara Alexandra,
1. não ignoro que o “austeritarismo” é uma polÃtica do regime capitalista que governa a UE. De resto, é por isso que fui deixando nos meus comentários sobre a questão do euro e da UE a ideia de que é necessário que as próprias lutas imediatas, em defesa dos direitos e liberdades ameaçados, se façam não só numa perspectiva defensiva, mas assumindo formas de organização democráticas que as tornem, ainda quando em torno de objectivos limitados, intrinsecamente “anticapitalistas” (Cf., por exemplo, http://5dias.net/2012/12/06/a-minhoca-e-a-maca-a-esquerda-nacionalista-e-o-euro-parte-i/comment-page-1/#comment-480615)
2. Considero que a adopção do euro se fez em termos aberrantes e que a moeda única, para o ser de facto, e não pela metade como é hoje o caso, teria como condições – a meu ver vantajosas para a maioria dos portugueses e para a maioria dos cidadãos da UE – a integração fiscal, orçamentam e polÃtica. Mas chamo também a atenção para o seguinte: se a entrada num comboio em andamento sem negociação das condições da viagem foi um mau passo, isso não significa que saltar do comboio em andamento não seja um remédio pior do que o mal. E concluo que o federalismo é a via que melhor convém à democratização das relações de poder (relações sociais de produção incluÃdas, evidentemente) que hoje asseguram a dominação oligárquica no conjunto da UE.
3. Sobre a dissolução da UE – ou sua implosão e fragmentação em benefÃcio de um retorno à s soberanias nacionais – permita-me a Alexandra que reproduza aqui o núcleo de um comentário que deixei na caixa dos mesmos de um post do João Rodrigues nos Ladrões de Bicicletas (cf. http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2012/12/minhoquices.html). No essencial, contém os argumentos que me levam a recusar a sua tese e a sua leitura da questão.
“a) À partida e em princÃpio, haveria condições menos más para travar as polÃticas austeritárias através da conjugação de esforços dos seus adversários na zona euro, do que isoladamente. Se se responder que isso não é possÃvel dado o apoio maioritário, em termos eleitorais, que tais polÃticas têm na Alemanha e noutros paÃses, a resposta é que o mesmo se passa, até ver, em Portugal – onde são os partidos do arco austeritário que, a crer nas sondagens, voltariam neste momento a ganhar as eleições [O argumento vale o que vale, mas, muito ou pouco, para os dois lados – uma vez que, se se disser que as condições podem ser mudadas por uma acção polÃtica adequada na região portuguesa, terá de se dizer o mesmo, digamos, da Alemanha…].
b) A posição do Syriza parece-me, sobre a questão do euro [e é dela que falo, que não de outros aspectos do seu programa], bastante mais razoável: não sair do euro, resistir à s ameaças de expulsão, apelar aos trabalhadores e cidadãos comuns europeus contra as decisões dos governantes – em suma, uma atitude a que chamarei de “exportação da luta” e dos conflitos.
c) No entender de Agostinho Lopes [que o João Rodrigues cita aprovadoramente no seu post] e para a sua área polÃtica, a saÃda unilateral do euro é manifestamente o primeiro passo de um objectivo geoestratégico que visa a implosão soberanista da UE, a par da reciclagem de um modelo próximo e herdeiro do outrora chamado “socialismo real”. Ora, a implosão da UE e a sua desagregação acarretariam uma regressão polÃtica e civilizacional enorme não só para Portugal, mas para todos os paÃses que a integram, e não só. Balcanização, regimes ditatoriais, militarização da vida económica e social, belicismo. Não vejo que mudanças económicas implementadas por um “Estado estratego” poderiam compensar o desastre. Em contrapartida, vejo bem que a todo este cenário só poderia corresponder uma degradação agravada das condições de vida da grande maioria dos portugueses (e, de novo, não só…).
d) Assim, a tese de que, não sendo possÃvel combater a austeridade governante da UE, federando as lutas e a resistência, resta a restauração da soberania plena e a via da “independência nacional”, parece-me ou uma confissão de impotência, ou uma profissão de fé ideológica autoritária e antidemocrática”.
Seu leitor atento
msp
Caro Miguel,
Obrigada pela resposta ao meu comentário.
A ideia da “moeda única feita pela metade” tem sido difundida por gente de diferentes quadrantes (tenho para mim que alguns, bem intencionados, o fazem ingenuamente). A verdade é que todos o sabiam já quando o Euro foi lançado. Como sabiam que a Zona Euro não correspondia a uma “zona monetária óptima”, etc, etc. Sabiam-no e avançaram ainda assim. Porquê? Na minha opinião, porque o Euro servia, serviu e serve interesses de classe, que ficam claros quando olhamos à evolução dos lucros e dos salários na zona Euro na última década (que refiro no meu comentário acima).
O lançamento do Euro, como os demais passos cruciais no processo de integração, deu-se desprezando qualquer debate e escrutÃnio públicos. Fugiram dos referendos como o diabo foge da cruz e desrespeitaram (com excepção da Dinamarca) o resultado dos poucos que se fizeram. Não foi por acaso.
O que mais me surpreende na sua fé na opção federalista é que espera dela, por qualquer razão mirÃfica que não logro descortinar olhando para os caminhos até agora trilhados pela UE, (espera dela, dizia) que vá ao arrepio de tudo o que até agora foi e está a ser feito. Ou seja: a polÃtica económica da UE é neoliberal; a polÃtica comercial da UE é neoliberal; a polÃtica agrÃcola da UE é neoliberal; neoliberal é também a sua polÃtica monetária e orçamental; e por aqui poderÃamos continuar (investigação, saúde, etc, etc.). Neoliberais são os seus tratados, o seu código genético. O avanço da integração (que se deu a par do acentuar do pendor federalista) conduziu-nos sempre a avanços neoliberais. Se quiser, sendo mais rigorosa, a avanços para o capital e a recuos para o trabalho.
Mas eis que, por qualquer passe de mágica, a integração fiscal e polÃtica nos levariam agora por outro caminho, ao arrepio de tudo o que foi feito até agora. Compreende que não possa deixar de lhe chamar uma “questão de fé”…
Insisto: avanços federalistas e correspondentes limitações da soberania dos Estados é o que têm vindo a defender há muito as organizações do grande patronato europeu e as forças conservadoras e da social-democracia (vergonhosamente, no caso destas últimas) que têm defendido os seus interesses. Por alguma razão o fazem. Um rápido passar de olhos pela constituição portuguesa deixa-o perceber facilmente, mesmo aos mais distraÃdos.
Confesso que não percebo muito bem esse fantasma a que chama de “implosão soberanista da UE” e os cenários apocalÃpticos que descreve. Parece quase que acha que não há opção progressista possÃvel fora do quadro da UE. Surpreendo-me, devo dizer, porque me parece razoavelmente claro é que dificilmente haverá opção progressista no quadro desta UE. Com estes tratados. Com estas polÃticas. Com a “livre concorrência no mercado único”. E com esta moeda única.
Se não fui suficientemente clara no comentário anterior, devo dizer que nada tenho em geral contra os projectos de cooperação e de integração. Dependendo, evidentemente, dos seus objectivos e orientação. Por isso me referi aos processos em curso na América latina. Que demonstram, além do mais, que soberania nacional não é sinónimo de isolacionismo; que alterações progressistas num dado paÃs (ainda que limitadas) são possÃveis num contexto regional profundamente desfavorável; que essas alterações estimulam e impulsionam alterações de sentido idêntico em paÃses vizinhos; que é possÃvel que o processo ganhe uma dimensão regional mais ampla, estendendo-se a vários paÃses e abrindo portas a novos projectos de cooperação e integração; que essas alterações não se deram a partir de instâncias supra-nacionais, mas a partir das lutas e das dinâmicas internas, em cada paÃs (que naturalmente influenciam e são influenciadas pelas de outros paÃses); que – muito importante – os processos contam com a adesão e legitimação popular, ao contrário do que acontece na UE.
Olho a UE e o mundo e é isto que vejo. Sinceramente, não creio que se trate de alguma “profissão de fé ideológica autoritária e antidemocrática”, como o Miguel sentencia, sem justificar. Com satisfação acolherei evidências empÃricas e argumentos que me mostrem ser outro o caminho. Estarei sempre disposta a reconsiderar. Mas não me convenço com fantasias nem tampouco com prontas sentenças ou rotulagens de “nacionalismo” ou quejandas…
Alexandra
Caro Miguel,
Obrigada pela resposta ao meu comentário.
A ideia da “moeda única feita pela metade” tem sido difundida por gente de diferentes quadrantes (tenho para mim que alguns, bem intencionados, o fazem ingenuamente). A verdade é que todos o sabiam já quando o Euro foi lançado. Como sabiam que a Zona Euro não correspondia a uma “zona monetária óptima”, etc, etc. Sabiam-no e avançaram ainda assim. Porquê? Na minha opinião, porque o Euro servia, serviu e serve interesses de classe, que ficam claros quando olhamos à evolução dos lucros e dos salários na zona Euro na última década (que refiro no meu comentário acima).
O lançamento do Euro, como os demais passos cruciais no processo de integração, deu-se desprezando qualquer debate e escrutÃnio públicos. Fugiram dos referendos como o diabo foge da cruz e desrespeitaram (com excepção da Dinamarca) o resultado dos poucos que se fizeram. Não foi por acaso.
O que mais me surpreende na sua fé na opção federalista é que espera dela, por qualquer razão mirÃfica que não logro descortinar olhando para os caminhos até agora trilhados pela UE, (espera dela, dizia) que vá ao arrepio de tudo o que até agora foi e está a ser feito. Ou seja: a polÃtica económica da UE é neoliberal; a polÃtica comercial da UE é neoliberal; a polÃtica agrÃcola da UE é neoliberal; neoliberal é também a sua polÃtica monetária e orçamental; e por aqui poderÃamos continuar (investigação, saúde, etc, etc.). Neoliberais são os seus tratados, o seu código genético. O avanço da integração (que se deu a par do acentuar do pendor federalista) conduziu-nos sempre a avanços neoliberais. Se quiser, sendo mais rigorosa, a avanços para o capital e a recuos para o trabalho.
Mas eis que, por qualquer passe de mágica, a integração fiscal e polÃtica nos levariam agora por outro caminho, ao arrepio de tudo o que foi feito até agora. Compreende que não possa deixar de lhe chamar uma “questão de fé”…
Insisto: avanços federalistas e correspondentes limitações da soberania dos Estados é o que têm vindo a defender há muito as organizações do grande patronato europeu e as forças conservadoras e da social-democracia (vergonhosamente, no caso destas últimas) que têm defendido os seus interesses. Por alguma razão o fazem. Um rápido passar de olhos pela constituição portuguesa deixa-o perceber facilmente, mesmo aos mais distraÃdos.
Confesso que não percebo muito bem esse fantasma a que chama de “implosão soberanista da UE” e os cenários apocalÃpticos que descreve. Parece quase que acha que não há opção progressista possÃvel fora do quadro da UE. Surpreendo-me, devo dizer, porque me parece razoavelmente claro é que dificilmente haverá opção progressista no quadro desta UE. Com estes tratados. Com estas polÃticas. Com a “livre concorrência no mercado único”. E com esta moeda única.
Se não fui suficientemente clara no comentário anterior, devo dizer que nada tenho em geral contra os projectos de cooperação e de integração. Dependendo, evidentemente, dos seus objectivos e orientação. Por isso me referi aos processos em curso na América latina. Que demonstram, além do mais, que soberania nacional não é sinónimo de isolacionismo; que alterações progressistas num dado paÃs (ainda que limitadas) são possÃveis num contexto regional profundamente desfavorável; que essas alterações estimulam e impulsionam alterações de sentido idêntico em paÃses vizinhos; que é possÃvel que o processo ganhe uma dimensão regional mais ampla, estendendo-se a vários paÃses e abrindo portas a novos projectos de cooperação e integração; que essas alterações não se deram a partir de instâncias supra-nacionais, mas a partir das lutas e das dinâmicas internas, em cada paÃs (que naturalmente influenciam e são influenciadas pelas de outros paÃses); que – muito importante – os processos contam com a adesão e legitimação popular, ao contrário do que acontece na UE.
Olho a UE e o mundo e é isto que vejo. Sinceramente, não creio que se trate de alguma “profissão de fé ideológica autoritária e antidemocrática”, como o Miguel sentencia, sem justificar. Com satisfação acolherei evidências empÃricas e argumentos que me mostrem ser outro o caminho. Estarei sempre disposta a reconsiderar. Mas não me convenço com fantasias nem tampouco com prontas sentenças ou rotulagens de “nacionalismo” ou quejandas…
Alexandra
Cara Alexandra,
agradeço, também eu, a sua atenção.
A Alexandra escreve:
“O que mais me surpreende na sua fé na opção federalista é que espera dela, por qualquer razão mirÃfica que não logro descortinar olhando para os caminhos até agora trilhados pela UE, (espera dela, dizia) que vá ao arrepio de tudo o que até agora foi e está a ser feito. Ou seja: a polÃtica económica da UE é neoliberal; a polÃtica comercial da UE é neoliberal; a polÃtica agrÃcola da UE é neoliberal; neoliberal é também a sua polÃtica monetária e orçamental; e por aqui poderÃamos continuar (investigação, saúde, etc, etc.)”.
O que se passa é que se poderia dizer o mesmo da opção soberanista – ou da história polÃtica recente de Portugal. Suponho que, por um lado, não me desmentirá, e que, por outro, não desiste por tão pouco, ou apesar de tudo…, de tentar mudar as condições em Portugal. São também as condições em Portugal – e não só, sem dúvida – o que me interessa mudar, resistindo à ofensiva oligárquica, para já, passando à ofensiva, rumo à participação democrática no exercÃcio do poder do conjunto dos cidadãos, a seguir. Simplesmente, penso que, para isso, um federalismo de sinal contrário ao actual governo da UE parece uma via mais verosÃmil, formativa, rica em potencialidades, do que a reivindicação soberanista e do que a aposta na implosão da UE, como objectivo em vista do qual a saÃda do euro seria um primeiro passo. É por isso que não desisto, a pretexto de que é preciso mudar as relações de forças em Portugal, de afirmar a necessidade de as mudar também na UE, através da conquista pelos trabalhadores e o conjunto dos cidadãos comuns de um controle efectivo das decisões em matéria polÃtica, económica, etc. Talvez isso a ajude a compreender porque é que, em vez de reivindicar um governo patriótico e de esquerda, tomo por lema a palavra de ordem: Mais democracia para a Europa, mais Europa para mais democracia.
Cordialmente
msp
Caro Miguel,
Duas observações:
1. Diz-me, em relação ao enunciado que fiz ilustrando o reaccionarismo da UE, que “o que se passa é que se poderia dizer o mesmo da opção soberanista – ou da história polÃtica recente de Portugal”. Ora, em primeiro lugar, é muito discutÃvel (para dizer o mÃnimo) que se possa caracterizar a história polÃtica recente de Portugal como uma “opção soberanista”, sendo ela marcada precisamente pela alienação de parcelas importantes (fundamentais?) de soberania (ou, no dizer de alguns “europeÃstas”, pela “partilha voluntária de soberania”). Em segundo lugar, se é verdade que a situação económica, social e polÃtica em Portugal se caracteriza por desenvolvimentos reaccionários, manda a mais elementar lucidez que se reconheça que esse processo é indissociável da integração na UE. Foram as regras da UE, os seus tratados, as suas polÃticas comuns, a determinar, em grande medida, alterações de peso na realidade económica e social nacional (das liberalizações e privatizações à concentração monopolista em vários sectores de actividade, passando pela concentração fundiária na agricultura, etc, etc). Em terceiro lugar: olhe para a constituição portuguesa e olhe para o tratado da UE (e junte-lhe se quiser a “carta dos direitos fundamentais da UE”). Recomendo-lhe vivamente que o faça. São como água e azeite, o dia e a noite. Onde um fala em democracia, outro fala em mercados e livre concorrência. E por aà em diante… São documentos que evidentemente traduzem uma determinada relação de forças no plano social. Num caso, favorável ao trabalho e à justiça social, no outro ao capital, à iniquidade e à injustiça social. Creio que isto, no mÃnimo, deve ser tomado em linha de conta por todos aqueles que se propõem transformar a realidade social (em Portugal e na Europa), na hora de escolher os melhores caminhos e opções para o fazer…
2. Creio que, no final das contas, ambos lutaremos por algo parecido: um Portugal, uma Europa e um mundo mais justos. A questão coloca-se, em grande medida, em como o conseguir. Na eficácia das diferentes estratégias. E é aqui que não posso deixar de lhe apontar alguma fantasia (se bem que, seguramente, bem intencionada). O debate é interessante e impossÃvel de se esgotar nestas linhas. Apenas diria, para terminar e de uma forma certamente muito esquemática, que na minha modesta opinião quem se propõe transformar a realidade polÃtica, económica e social tem em primeiro lugar que se confrontar com o poder. Depois, desejavelmente, lutar pela tomada desse poder e, no final, alcançando-o, utilizá-lo (passe a expressão, avisei que ia ser esquemática… tudo isto pressupõe evidentemente uma genuÃna legitimação democrática) para proceder à pretendida transformação. Não obstante a evolução da UE dos últimos anos, ela ainda é um processo de integração de Estados. No limite, são os Estados quem decide as polÃticas a aplicar, os memorandos e os tratados que assinam e aplicam, as excepções e os “opt-outs”, as contas com que se coze (o “z” é intencional) cada povo… Esta será, enfim, uma instância decisiva (não exclusiva, admito, mas pelo menos decisiva) nesse confronto e luta pelo poder. Claro que há também quem acredite na transformação sem o poder. Mas aqui, na minha modesta opinião, voltamos ao domÃnio da fantasia…
Até breve,
ANM
Cara Alexandra,
também eu não quero eternizar a discussão. Mas a Alexandra levanta agora uma nova questão – que é a da tomada do poder, e é fundamental. Talvez voltemos a discuti-la, tanto mais que, em certo sentido, essa questão “sobredetermina” todas as outras que tocámos.
Para já, no entanto, terei de me contentar com observar o seguinte. Numa perspectiva de democratização anticapitalista, tão importante como tomar o poder é transformar, ao conquistá-lo, o seu modo de exercÃcio. O que significa que, na mesma perspectiva, a tomada do poder e a sua transformação são processos inseparáveis, ou um e o mesmo processo. De que transformação do exercÃcio do poder se trata aqui? Pois bem, trata-se da instauração da participação igualitária de todos nas decisões colectivas que os vinculam. Trata-se da devolução aos trabalhadores e cidadãos comuns da condição governante que classicamente, de resto (veja Aristóteles), a definição de cidadão pressupunha. Daà que, abreviando razões, este objectivo final – que pressupõe o do fim da exploração e a sociedade sem classes -, nos fornça também o critério do “anticapitalismo” das lutas e acções presentes. Ou seja, e como deixei escrito num comentário anterior a este mesmo post:
‘João,
pego na tua pergunta certeira — “A questão que se coloca é: é toda a esquerda que se diz anticapitalista realmente anticapitalista?†—(…) e adianto um começo de resposta.
O que penso é vai sendo mais do que tempo de dizermos bem alto, e de tirarmos as consequências disso em vista da acção, que para ser anticapitalista a luta tem de começar por ser democrática (tanto nos seus objectivos como na sua organização, ou regime que instaura), e que o grau de anticapitalismo de um movimento se mede pela democratização que instaura por onde passa e está, a começar pelas suas próprias fileiras’.
Ora bem, se nos pusermos de acordo sobre esta questão, a Alexandra e eu estaremos de acordo no essencial. E poderemos depois, à luz do “critério da democracia”, discutir melhor a questão da Europa, do euro, da melhor maneira de combater o austeritarismo – e não só. Movidos, claro, pela vontade de um mundo melhor e mais justo.
Até breve, pois, como V. diz.
Cordialmente
msp