Anselm Jappe
Mehdi Belhaj Kacem
«Diga-se de seguida: Empire nada mais é do que uma outra variante, de look pós-moderno, do operaismo italiano dos anos 70, o que, por seu lado, nada mais foi do que uma versão moderna do marxismo tradicional, considerado na forma da Segunda Internacional (1889-1914) e de Lenine. Como se poderá ver, por detrás da verborreia “absolutamente moderna†de Empire enreda-se a ideia segundo a qual o trabalho vivo se deve desembaraçar do capital parasitário.
(…) convém entretanto mencionar tudo aquilo que os seus autores [Negri e Michael Hardt] não afloram sequer: a mercadoria, nem o dinheiro, nem o trabalho são aqui introduzidos como conceitos a criticar. Ao contrário de Marx que sempre se negou a considerá-los dados “neutros†e “naturaisâ€, como podem também ser categorias como “produzirâ€, o “bem†ou o “objectoâ€, espalhadas por toda a sociedade.
Para Marx, a mercadoria e o valor, o dinheiro e o trabalho, são categorias negativas: são formas destrutivas e autodestrutivas através das quais a actividade é congelada. Toda e qualquer proposta revolucionária ou de emancipação deverá pretender libertar a humanidade destas categorias. Para toda a teoria crÃtica do mundo contemporâneo que se reclama de Marx, a crÃtica das categorias fundamentais deverá ser um discurso preliminar a todos os outros, como Marx fez.
Os autores de Empire, pelo contrário, aceitam as categorias na sua aparência de categorias naturais, ontológicas, antropológicas, exactamente como o faz a ciência burguesa.»
(Anselm Jappe, Robert Kurz, Les Habits Neufs de L’Empire: Remarques sur Negri, Hardt et Rufin, Paris, Lignes, 2003, p. 16).
Portanto, poderá a leitura continuar a ser proveitosa por estas bandas; sigam a minha pista, sff
(não, não, ou sim, sim, M.S.P. não traduz coisas destas, nem Anselm Jappe nem Mehdi Belhaj Kacem, um autor que eu e o nosso amigo Niet muito, mas mesmo muito, recomendamos; de M.S.P. tradutor, salvo raras excepções, contentem-se com Steiner e Fernando Savater e quejandos, magnÃficos aliás):
O Jappe não me interessa muito.
Já o Mehdi Belhaj Kacem sim, muito definitivamente.
http://fr.wikipedia.org/wiki/Mehdi_Belhaj_Kacem
Caro Carlos
(nao tenho acentos)
Caso nao saiba o Mehdi eh um dos integrantes do colectivo tiqqun. As Edicoes antipaticas tem uns quantos livros editados deles.
Caro Carlos Vidal: A crise – e como ela é dramáticamente descrita pelo Medhi Belhaj Kacem !- deixa-nos pouco espaço para o que Nietzsche apelidava de ” o combate do saber com o saber!”. O ” normalien ” Kacem- já com uma volumosa obra- onde o ” O EspÃrito do Nihilismo “é baliza e farol- foi aluno de Badiou, do seu mestre C. Vidal, e polemiza muito com ele. Foi também situ. e gosta muito de Castel, Deleuze e mesmo de Bouveresse. E discute com revolucionários que me são caros, como o Milner(muito) e um pouco Bensaid, criticando Negri e Hardt. ” A polÃtica é muito simplesmente outro modelo de sociedade. Se não se tem nada a propor, não vale a pena fazer polÃtica dizendo: resiste-se, vamos atacar a mundialização”, acentua M-B.Kacem num texto apologético intitulado ” Leninizar Debord”, onde ainda sublinha: ” Creio, de acordo com Badiou, que só existe polÃtica revolucionária. Badiou tenta provocar jogando a proclamação da sua pretensa fidelidade ao maoismo. Ele não quer saber para nada do Estado chinês- ele rejeita-o como todo o tipo de Estado-só preconiza o processo revolucionário “. Em relação ao M.S. Pereira, entendo que é um grande intelectual orgânico e militante, com quem tenho estreitas afinidades polÃticas, com uma obra multifacetada e uma produção de traduções que o tornam num dos maiores operadores de todos os tempos. Acho que V. deviam acertar agulhas e voltar a colaborar, pois, como gosta de lembrar o JC-Milner, a ” revolução não é para os outros, nem para mais tarde. É para nós, aqui e agora “. Salut! Niet
Meu caro,
não o desconhecia Ed.an, mas estava a referir-me à s obras pelo seu “nome individual” assinadas e ao opus magnum (até ao momento):
“L’Esprit du Nihilism: Une Ontologique de l’Histoire”, de 2009.
Mas há outros tÃtulos possÃveis.
E o que não há é porquê?
No “L’Esprit…” é medo das suas 620pp ?
Medo de um nome que se “diz” de forma mais difÃcil do que “Toni Negri”?
Medo de um aluno de Badiou (julgo eu)??
(Não esquecer que Port. descobriu Zizek tarde e a más horas: vieram uns dez tÃtulos em pouco mais de um ano – nada mau, mas… pouco.)
Além disso, e aqui é que bate o (meu) ponto: um tradutor não deve ser somente uma máquina de verter uma lÃngua noutra. Cabe-lhe relacionar-se e relacionar-nos com o livro. Eventualmente fazer uma boa introdução, prefácio, posfácio…
João Barrento, António Marques, José Miranda Justo… e quem mais?
De qualquer maneira, Ed.an, grato pelo seu comentário.
Além disso, meu caro Niet, não há colaboração possÃvel com um anticomunista de matriz psicopatológica.
Badiou sempre vem dizendo que não pretende primariamente criminalizar o chamado “socialismo real”, não está interessado nem participaria numa qualquer forma de deminização, só por si, de Estaline (e, naturalmente, muito menos Mao).
Veja os insultos patológicos que MSP me dirigiu a propósito disso. Foram-me dirigidos a mim, e não a Estaline!
E não me causam grande problema.
e espero que os insultos que tu diriges, principalmente quando acometido de furor ideológico também não causem moça ou grande problema aos visados.
O Carlos Vidal mente como de costume: traduzi Debord e textos situacionistas, traduzi Negri e Hardt, traduzi Badiou, Zizek, Rancière, Nancy e sei lá quantos mais. Gente que por vezes me interessa e outra nem tanto. La Boétie, Orwell, Marcuse,Arendt, Castoriadis – bem como romances de segunda e ensaios que não recomendo especialmente. Deleuze, o sobrestimadÃssimo Foucault, Bergson e Lyotard. Enfim, sou tradutor profissional há mais de trinta anos – não é de admirar que tenho traduzido de tudo um pouco, mesmo deixando de lado a literatura propriamente dita.
Mas esta questão é absolutamente desinteressante nos termos em que o postador a levanta: para fazer arruaça e bolsar a bÃlis antidemocrática do costume.
Boa noite.
msp
MSP está a contabilizar tudo, tudo, mesmo textos em antologias e ensaios, livros de primeirÃssimo e livros de segundo plano. Recomendo-lhe o “L’Esprit du Nihilism: Une Ontologique de l’Histoire†do Kacem.
Recomece aÃ.
Mas uma coisa é certa:
MSP traduziu mais, muito mais, muitÃssimo mais do que os nomes que eu citei, e traduziu mais do que a soma desses outros todos – Barrento (podia ser Quintela, mas refiro autores vivos e activos), Marques e Miranda Justo. Autores que se ligam ao que traduzem, escrevem abundantemente NO que traduzem, prefaciam (Marques com Nietzsche ou Miranda Justo com Richard Wagner, etc.), organizam, e por esses objectos se co-responsabilizam, deles são cúmplices.
MSP traduziu mais, muitÃssimo mais, mas os meus modelos são os que eu citei.
E não darei mais troco aos insultos de MSP (que os usou abundantemente, só porque me interessou o Ludo Martens, estudioso de Estaline – já agora, porque não passa pelo Martens??).
Ao CV eu recomendaria a leitura atenta de algumas das obras citadas no seu “Democracia e Livre Iniciativa” (Lisboa, Fenda, 1996). Não, o progresso não é unilinear – nem sequer garantido. E de ex-comunistas, ex-sindicalistas, ex-socialistas radicalÃssimos sempre estiveram bem fornecidas as fileiras do “fascismo” (sem excluir a variedade lusa).
msp
Quando o reformismo se revela em relâmpago, pag.21 a meio, para não referir a pag.23, o resto são artigos da Capital, Público e revistas de divulgação de fotografia e etc e tal. Actualmente é mais Bideo e Instalação Bideo, não?
autores em tempo real e no deserto, então os autores não morreram?
autores por autores temos os de Mem Martins e hoje de novo os da recuperação.
C. Vidal: Não é só o Mehdi B. Kacem que V., os badiousianos, devem promover. O grande enigma- e alvo das maiores apostas nos meios pariseenses- trava-se em trono da personalidade – há quem diga que é um pseudónimo do A. Badiou ele-mesmo- e que dá pelo nome de Sylvain Lazarus, citado amiúde nos textos do autor de ” De quoi Sarkozy est-il le nom? “.Sff, deite para o caixote-do-lixo tudo o que, de perto ou de longe, se relacione com Estaline, Mao, etc. Salut! Niet
Caro Niet, fez bem em recordar essse estranho nome, autor precisamente de “Anthropologie du Nom”. No “Compêndio de MetapolÃtica”, Badiou apresenta-o como um dos pensadores franceses mais interessantes, em 2 capÃtulos. Lazarus existe ou não? Seja como for é sempre apresentado como tendo nascido em 1943 e professor de Antropologia na Universidade de Paris VIII. Alguém deve conhecê-lo, senão é o próprio Badiou, claro. Seria uma descoberta interessantÃssima. Vou voltar a pegar no “Anthropologie du Nom”. Averigue o meu caro amigo também o estilo da coisa: das ideias, da escrita, da estrutura….
(Quanto ao Mao e ao Estaline, fora? Como? Só depois de muito bem estudados.)
Carlos e Niet,
Parece que o gajo existe e não se faz passar despercebido: http://www.asile.org/facoff/numero01/guerreprof/accusat.htm
A relação dele com o Badiou é que terá conhecido melhores dias. Parece que levou a mal que ele saÃsse da Organisation Politique. Só sei o que li neste artigo, de resto miserável, de uma publicação muito pouco recomendável: http://toutsurlachine.blogspot.com/2010/03/portrait-badiou-la-star-de-la-philo-est.html. No entanto, a ruptura é confirmada pelo próprio Badiou em discurso directo.
Carlos,
Quanto ao conteúdo do post em si, que é o que de facto interessa discutir, devo supor que subscrever o conteúdo das crÃticas do Jappe, daà o tal excedente de realismo sobre o Negri, certo? Depreendo que vem da ausência de uma crÃtica do « dinheiro », do « trabalho » e da « mercadoria », de acordo com o excerto que reproduzes. Parece-me discutÃvel que não haja uma crÃtica do valor e do trabalho no Negri, e ainda mais duvidoso se essa crÃtica se extender a toda a corrente operaÃsta.
Mas mesmo dando isso de barato, confesso que me surpreende essa tua crÃtica do Negri por falta de realismo, pelo menos nesse entendimento de realismo, que passa necessariamente pela crÃtica da economia polÃtica. Como deves calcular, é uma crÃtica que se costuma aplicar, de forma ainda mais violenta, ao Badiou, ao Rancière, ao Agamben, a todas para quem o pensamento da polÃtica (coisa bem diferente da filosofia polÃtica, como sabemos) não passa pelas categorias do marxismo. O que me surpreende mais é que, ainda há uns meses, criticavas o Negri a partir do pressuposto contrário. Lembro-me que, numa caixa de comentários, em diálogo com o Nuno Ramos de Almeida, te irritava o pressuposto de partida do Commonwealth de que vivemos num mundo « with no outside ». Partilho essas mesmas reservas em relação ao pensamento do Negri e subscrevo o juÃzo do Rancière a esse respeito: « a inteligência colectiva produzida por um sistema de dominação só pode ser uma inteligência desse sistema ». Mas aqui ainda estamos mais longe do realismo à la Jappe do que com o Negri, não te parece?
Quanto ao Miguel Serras Pereira, não me parece muito justo estar a comparar o trabalho de um tradutor profissional, como o MSP, com académicos como o António Marques,o o José Miranda Justo e o João Barrento. Nestes, o tarefa do tradutor é um prolongamento do trabalho académico, e está subordinado, a maior parte das vezes, apenas ao interesse intelectual na obra traduzida. No caso do MSP, em que a tradução é o modo de vida, a escolha da obra a ser traduzida está dependente das propostas que são feitas, e se se escolhe só aquelas que se acha interessantes de um ponto de vista teórico, então provavelmente não se consegue fazer disso modo de vida. É por isso normal que em muitas delas, porventura a maior parte, o tradutor não inclua prefácio ou estudo introdutório. It’s a living, and that’s all. Daà que, no caso concreto do MSP, ele tenha traduzido coisas tão diferentes e com valor diferente – desde o cada vez mais imprescindÃvel Foucault ao sobrevalorizadÃssimo Castoriadis.
Queria deixar claro que politicamente estou a milhas de distância do Miguel Serras Pereira e do seu neo-neo-kantismo agora em roupagens libertárias – excepção feita à sua rejeição das chamadas « politicas de identidade », rejeição que subscrevo totalmente – mas não posso deixar de reconhecer o excelente tradutor que ele também é, como tive a oportunidade de comprovar ao rever recentemente alguns textos que ele traduziu. Pegar em textos, nada fáceis, de autores como Jean-Luc Nancy e Jacques Rancière e pô-los de maneira que parece que foram escritos em Português é, na minha opinião, obra de monta.
Um abraço,
Bruno
a propósito, radical radical era alguém que traduzisse já o “L’Esprit du Nihilism: Une Ontologique de l’Histoireâ€, profissional ou académico.
Concordo com luÃsa.
Mas, para já, quem o vai fazer?
Fica o desafio, e não vale começar por pequenos ensaios ou obras “menores”. O que é urgente, urgente é e será.
Bruno,
Três questões, portanto.
Uso no tÃtulo deste post, é facto, a palavra “realista”, MAS entre aspas, como se vê.
Aqui “realista” é o contrário do “realismo” (ou pretensa actualização dos dados contemporâneos) de Negri.
Comparado com Jappe, Negri é uma espécie de pré-realista, pois fica-se por esse mundo de ideias e práticas onde só cabe o que existe with no outside, e não cabe aquilo que um Derrida chama de post-scriptum nem Jappe de crÃtica preliminar à crÃtica do capitalismo (está na minha citação).
Ora bem, Jappe seria um “realista” na mesma medida em que Badiou o é, não parecendo sê-lo quando o comparo com Negri e outros (estes verdadeiramente realistas e “contemporâneos” – outra categoria desinteressante).
Pega no “Empire” (original) e lerás no inÃcio:
“Empire is materializing before our eyes”.
É o contrário do “acontecimento em Badiou. Exactamente o contrário: Negri/Hardt falam do que está diante dos nossos olhos e Badiou diz-nos que o acontecimento é a irrupção do inédito e é INDISCERNÃVEL. Ora, o que eu acho é que o aparente “irrealismo” de Badiou é realista (porque esta irrupção é inevitável), e o “realismo” de Negri é muitÃssimo limitado.
O “realismo” de Jappe (como o de Badiou) é atento, porque supõe a crÃtica dos valores existentes em nome de uma transformação radical das formas de viver actuais. O “realismo” de Negri é limitado, porque aceita, em nome da actualidade, as condições e os valores actuais, e apenas supõe uma ligeira mutação ou crÃtica em nome do que os seus “olhos” divisam claramente como sendo o nosso mundo.
Volta ao “Empire” e lê um exemplo do que eu digo no capÃtulo 1.3 “Alternatives within empire”. Umas páginas depois do inÃcio do capÃtulo lá está a malfadada “actualização”: aos autores já não serve a metáfora da toupeira (Marx) que tem de ser substituÃda pela da “serpente”. É esta actualização que me desagrada, por assim dizer. Se para cada polÃtica e tempo de emancipação tivessemos de actualizar um programa atrás de outro, 5 ou 6 anos depois lá teria de vir um Empire II, um Empire III, como um PEC III ou PEC IV, ou o Parque Jurássico II, III, IV………….
O que diz aqui o Badiou é que, com ou sem metáforas actualizadas, o aconteceimento dá-se e de forma indiscernÃvel, imprevisÃvel e injustificada/injustificável. E como não pode deixar de se dar, quase sem programa e sem metáfora (é uma espécie de revolução em estado puro, pois a sua forma e consequências são inéditas e sem precedentes), Badiou é um realista, está do lado da conhecida expressão “paixão do real”.
É neste sentido que aparece a palavra “realismo” no tÃtulo deste post.
Outra questão, quem é Sylvain Lazarus?
Creio que as especulações se devem ao facto de ser uma personagem obscura que não publica nada desde 1996.
Caso a seguir.
Traduções.
Com efeito citei como exemplares alguns tradutores académicos.
Mas, repara, nem todos a trabalharem na sua área de estudos; um exemplo: o José Miranda Justo, sem ser musicólogo nem crÃtico musical, fez um trabalho de dedicação extrema a Wagner. Era a esta dedicação que eu me referia, e acho decisiva num tradutor.
Como acho decisivo um tradutor ter uma linha de trabalho (como a tem um crÃtico musical ou de arte, plurais, inevitavelmente, mas com um “eixo”) – o que passa por opções claras, como a de privilegiar, com urgência, uma tradução como a do livro de Kacem. Mas, um tradutor profissional não é, obviamente, um tradutor de “tendência”, mas não deveria ter alguma e daà derivar para algo que lhe interessa menos ou nada?
Traduzir “bem” não basta, seria decisivo também marcar-se posição, uma posição que não abolindo o casuÃsmo inevitável da profissão, pelo menos o “iluminasse”. Mas este ponto da nossa conversa é o menos importante.
Mais importante é a explicação e a discussão em torno do real/realidade/realismo, que, apesar da hora, tentei alinhar na sÃntese possÃvel.
Carlos,
Esse realismo de que falas, o realismo do « real », é uma outra história, de facto. O que não consigo discernir, mas isso provavelmente é uma insuficiência minha, é essa aproximação entre o Jappe e o Badiou. O Jappe é realista no sentido Badiouano-Lacaniano da palavra « real »? Do que li e ouvi dele – ele esteve em Lisboa duas vezes nos últimos anos, tal como o Negri – não me pareceu nada que ele aderisse a essa concepção do real, nem explÃcita nem implicitamente. Não basta pensar que o real não se reduz ao imediato – o negri, neste caso, também não é um empirista. Corrigi-me se estiver enganado, mas no Jappe a passagem do imediato ao real é algo como a passagem hegeliana do ser à essência e, no Marx, da mercadoria ao valor.
No Badiou, como sabes, não há ciência que dê acesso ao real, que por definição é o que se subtrai ao conhecimento, e cuja passagem do ser à existência, da indiscirnibilidade ao regime da visibilidade é efeito de um acontecimento incalculável. No Jappe e no Negri parece-me que temos duas variantes do Marxismo, com genealogias diferentes, que resultam em teorias muito diferentes mas que são em última análise, réplicas do sismo teórico chamado « Marx ». No Badiou, a partir de meados dos 80, o marxismo é, parece-me, apenas uma referência distante.
Um abraço,
Bruno
Bruno, perguntas muito bem,
O Jappe é realista no sentido Badiouano-Lacaniano da palavra
«real»? Certamente que não, ou pelo não o manifesta, as suas formas de pensar e referências são outras.
Mas o Jappe, o Zizek e o Badiou partilham uma fulcral suspeição em relação às várias formas de altermundialização, ou de vivências alternativas no seio do capitalismo avançado. Para Jappe, Badiou e Zizek, os movimentos de altermundialização oscilam entre a folclorização (Zizek, no estudo sobre Deleuze) e a luta defensiva (Jappe), ou a desterritorialização como nova forma de territorialização ou falso cosmopolitismo em Badiou (no estudo sobre S. Paulo).
Em Negri, por outro lado, há uma confusão de conceitos que gostaria de ver melhor explicados: uma defesa acesa de uma coisa chamada cidadania global (e o cosmopolitismo não passa pelo cliché de “cidadão do mundo”), por um lado, e, por outro lado, uma defesa das lutas locais. A mim, esta adaptação à realidade actual do capitalismo avançado não me faz sentido. É até muitÃssimo forçada e, como dizer, um bocado “estética” (um rodriguinho).
No “Empire”, em 1.3, é claro este ponto: o Império não tem centro, logo uma luta num qualquer ponto, “vertical”, é ou pode ser uma luta dirigida ao coração do Império. Ora, se é partindo de uma atenta análise do real (diria “sem paixão”, porque esta terá de ser revolucionária ou “evenemental”), que se chega à conclusão de que o Império já não tem centro (conclusão de certo modo pacÃfica), já não percebo que consequências pode ter uma “vitória vertical”.
Cito:
“Empire presents a superficial world, the virtual center of which can be accessed immediately from any point across the surface. If these points were to constitute something like a new cycle of struggles, it would be a cycle defined not by the communicative extension of the struggles but rather by their singular emergence, by the intensity that characterizes them one by one. In short, this new phase is defined by the fact that these struggles do not link horizontally, but each one leaps vertically, directly to the virtual center of Empire”.
Em 4.3 Negri/Hardt vão ao ponto de se aproximarem das teses pós-coloniais defendendo a hibridização da multitude. Ora, como sabes, a hibridização é uma forma encapotada (em Bhabha) de acabar com os urgentes processos de conflitualidade. E é da conflitualidade que pode nascer, surgir, o acontecimento.
Para já, e falando talvez depressa demais, afigura-se-me isto.
CV
CarÃssimos Vidal e Bruno Peixe,
Venho tarde mas, se me permitem, trago apenas um pequeno comentário que me parece pertinente no pouco que posso oferecer a esta discussão!!
– Contrariamente ao caro Vidal não creio que a ideia “comunista” seja uma invariante humana. Digo-o sem valor ou desvalor, sem graça ou desgraça, apenas o não é porque não o é!! Partindo deste pressuposto, e da revelação da história, é coerente encontrar a pulsão mercantilista, impulsiva, individualista, não esclarecida, destrutiva, como génese e ontogénese do homem que apenas as valorações reveladas vieram constranger, tornando peremptória a racionalidade do justo e do óptimo.
Ora, caro Vidal, a erosão ao constrangimento da razão e das instituições que tornam peremptório, real, mediato, tangÃvel e possÃvel este mÃnimo ou esta reserva de domÃnio sobre um produto serão, a mais, um contributo para a ulterior redução das coisas a um valor de troca mercantil!! Não poderá ser esse o lugar do acontecimento!!?? Não será a resistencia ao capitalismo, como forma de convivencia possÃvel, uma resistencia ao acontecimento que pode surgir da tal conflitualidade nua e inconstrangÃvel!!?? Que adestramento da alma poderá daà surgir!?
Meus caros: Vou tentar entrar em contacto com uns amigos experts da EEHSS, esta noite em Paris, para saber da ” estória ” do S. Lazarus. E o M.B. Kacem fala e elogia muito também o Pierre-Henri Castel, um filósofo marginal. Tenho lido umas coisas do Mehdi: ele é um outsider, fora dos limites estreitos, perversos da Universidade. E defende muito a leitura conjunta do Badiou e do Deleuze, com grandes elogios a Lacan. Salut! Niet
Amigo Niet,
Venham então de lá quanto antes as notÃcias deste interessantÃssimo caso Lazarus (se bem que eu creia que a figura existe mesmo). Ora bem, se ele não existisse, alguém de Paris VII já o tinha ventilado e assegurado.
Tenho aqui já em cima da secretária o “Anthropologie du Nom”.
Abraço
CV
(Entretanto, quanto à leitura conjunta de Badiou e Deleuze, tenho as minhas dúvidas. Preferiria propor a de Badiou e Sartre. Abraço.)
Caro C. Vidal: Hoje até já falei 2 vezes com o casal meu amigo da EHESS. Por causa do Blanchot. Eles como são ” super-barras ” no marxismo…deu para discutir, claro, a mundivivência do Maurice B.
O Lazarus é antropólogo e prof. em Paris VIII( 8), dos cÃrculos do Bernard Cassen…Andei eu a ver no Google. Vou esperar que eles- os pariseenses- voltem das compras…para lhes telefonar pela 3.a vez hoje. Estamos a ficar mesmo loucos.O que é bom sinal!
Ontem perdi parte da tarde a reler o Castoridis mais antigo- Instituição Imaginária da Sociedade – para tentar responder ao JP Cachopo. O Castoriadis faz uma crÃtica interna à teoria da dominação da Escola de Francfort, pelo menos. Mas a questão do JP. Cachopo era outra, por isso, contra a minha vontade deixei cair.E foram umas boas 4 horas de leitura sintomática. E não sei onde pára a minha” Dialéctica Negativa” do Adorno…O Medhi aposta no Badiou/Deleuze;o Sartre funcionou mal com o Husserl, Heidegger e o Bataille, como assinala subtilmente Deleuze; e o M.B.Kacem aprecia o Deleuze por causa da sua teoria do Desejo. Agora mesmo- 19 horas 44m – liguei para Paris: confirma-se a existência concreta, real em carne e osso de Sylvain Lazarus, segundo os meus amigos. Bom Vento! Niet
C. Vidal: Confirmei a identidade fÃsica e intelectual de S. Lazarus. Prof em Paris 8, como o Badiou. Enviei um comment, que não chegou. Há poucos minutos. Salut! Niet
O Mem Martins aprecia o Deleuze, então chumba-o.