Camilo inventa sempre uns tipos inacreditavelmente bons e inacreditavelmente maus, sem os meios-tons de que as pessoas realmente são feitas. Por isso têm tanta graça “O Regicida” e a sua sequela, “A Filha do Regicida”, por ele pôr em cena, a pretexto de um daqueles episódios de erudição histórica de que tanto gosta, duas personagens tão espessas e contraditórias que até parecem gente. Certo, a filha e o paizinho do regicida são bons demais para acreditar, e o traidor Roque da Cunha é isso e apenas isso, um traidor miserável, ao qual não se aplica aquela canção do “Música no Coração”: “But somewhere in my wicked, miserable past, I must have done something good“; mas de Domingos e Maria Isabel – respectivamente o regicida e sua mulher – não se pode com facilidade dizer se fazem parte dos bons ou dos maus. Ao longo da história, Maria Isabel tem quatro-homens-quatro, incluindo, para além do legítimo marido, um padre (!) e el-Rei de Portugal (!!); o padre, porém, seduziu-a era ela menina e desse pecado original não houve (não podia haver?) remissão, e daí que o fado a vá dirigindo, sempre à vista do leitor, que assiste dividido entre a reprovação e a simpatia, até aos mais fundos abismos da moral. Quanto a Domingos, é vítima de si próprio e do seu elevado conceito de honra, que o conduz à perdição absoluta. O grande físico Guevara, celebrado autor da “De re anatomica“, ainda o levou a crer na hipótese de um hímen miraculosamente reconstituído; mas quando os factos, na sua simplicidade brutal, se impuseram, inquestionáveis, e ele temeu fama de corno, aí esperneou, só para acabar cortado às postas, e o que sobrou espetado na praça pública, para exemplo geral. Camilo não o culpa nem o desculpa, faz ver que, face ao código de valores do tempo (século XVII), o seu comportamento até se entende, mas insinua que ele também escusava de exagerar. A moral da história é que um homem deve ser apenas moderadamente honrado, e saber fechar os olhos a certas coisas.
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Estás a dar-me vontade de ler a coisa. Logo a mim, que ainda menino me enfadei das dúzias de Camilos que pululavam pela biblioteca dos avós…
É; Camilo é livro de avós – mas já faltou mais para nós lá chegarmos.
Grande e grandemente lamentável verdade.