Se Nanni Moreti fosse francês, talvez estivesse agora a estudar o argumento de uma eventual sequela a «O Caimão». Ao cinema francês não faltam criativos capazes de levar a bom porto a cinematográfica tarefa, e à França não parece faltar condimento político que sirva de argumento a um filme presidencial. Diferenças à parte, Sarkozy é um aristocrata de descendência húngara e não um magnata dos media e afins. Semelhanças de perto, iates, férias, uma mulher colunável e a fotografia oficial do novo Chefe de Estado francês, posse de estadista, a biblioteca do Eliseu de pano de fundo colorido pela bandeira francesa, já não desamparada mas ladeada pela bandeira da UE, momento captado por Philippe Warrin, especialista da ilustração cor-de-rosa.
Depois da ida a banhos a Malta, Sarkozy chegou, viu e após a vitória voltou a vencer pela surpresa. Compôs um governo paritário, multipartidário e multietnico. Cosmopolita, portanto. E rumou a Bruxelas, onde se encontrou com José Manuel Barroso (antes Durão), por quem sente uma “grande amizade, estima e confiança”, anunciando que para a Europa a França deseja simplificação, um governo económico que contrabalance (ou mine?) o papel do BCE, uma nega completa à Turquia e uma aparente (que de aparente tem pouco) manutenção do «status quo» da agricultura francesa no âmbito de uma intocada PAC.
As férias foram revigorantes! Mas é preciso não esquecer que Sarkozy pensou na sua presidência durante longos anos, logo pela manhã, enquanto fazia a barba. Homem de barba rija, a tarefa tomar-lhe-ia seguramente uns quantos minutos matinais, pelo que nada está fora do «plano».
O Gaullismo, que jazia já moribundo pela desistência de Chirac, é agora tradição morta. E Chirac, antigo mestre, foi primeiro vencido pela ambição do discípulo e agora pelo estilo do Presidente. Um zero para Sarko.
Ségolène foi substituída no imaginário de uma França rendida aos encantos da política no feminino, por Rachida Dati, a nova Ministra da Justiça. Pai marroquino, mãe argelina, esta francesa da diáspora, nutre um especial fascínio por Sarkozy, que acompanha desde 2002, e diz de si «Eu sou um símbolo da França». Dois zero para Sarkozy: pela primeira vez a França tem uma ministra descendente de imigrantes das ex-colónias, num governo onde pontua Brice Hortefeux como Ministro da Imigração, Integração e, «voilà», Identidade Nacional.
O PSF, que tem as legislativas de Junho para disputar, também está representado no novel Governo da França. O histórico Bernanrd Kouchner, agora nomeado «ministre des Affaires étrangères et européennes», representa a abertura de Nicolas aos socialistas. Presente envenenado, a conhecida vaidade de Kouchner fez estragos: François Hollande já deu notícia da expulsão do agora Ministro do PSF, catalogando a abertura de Sarkozy como uma «aventura individual», e não propriamente um romance aberto. Vamos em três. A zero.
A moderação da UDF também está representada. Hervé Morin é o novo Ministro da Defesa. E a paridade, cosmopolita e coquette com Dati, é completada numa versão mais tradicional por outras seis ministras, num governo de 15. Quatro zero?
Mas esta composição governamental é reflexo da nova era que se experimenta no Eliseu: após uma entrada digna dos anos de ouro da «jet-sética» Cote d’Azur, os jornalistas e comentaristas adjectivam já o estilo Sarkozy: aparatoso, hollywoodesco, deriva monegasca, um Presidente bling-bling, apelo aos sentidos feito pelo «Nouvel Observateur» – tudo em Nicolas Sarkozy reluz e tilinta pela vaidade, luxo, sofisticação… e tudo devidamente registado com imagem e som, por fotógrafos, câmaras, televisões.
Este bling-bling todo ainda não trouxe dissabores de maior ao novo patrão da França. Sim, quem manda é o Presidente. A Fillon, Primeiro-Ministro, calhará o que calhar. E a França, que se enamorou pelo «glamour» dos candidatos Sarko e Ségo, que pelo meio ainda pensou melhor e ameaçou preferir o cinzentismo rural de Bayrou, mas voltou ao primeiro amor e elegeu Sarkozy, vive encantada neste cenário de sofisticação aristocrática que parece, mas só parece, devolver à França a grandiosidade há muito perdida.
Parece ser tradição que os homens pequenos, estrangeiros ou «astrangeirados», chegando ao poder na França imponham o estilo quero-posso-mando. Em tempos idos, a pose valeu exílio. O que valerá o estilo bling-bling a Sarkozy?
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