O realizador Gillo Pontecorvo morreu ontem. Teve a capacidade de criar uma obra que se mantém perigosamente actual: “A Batalha de Argel” (1965). Há dois anos, o New York Times noticiou que o filme foi passado numa sessão de trabalho no Pentágono. Os responsáveis norte-americanos, a braços com a insurreição iraquiana, pretendiam perceber como é que se domina uma população em revolta. A lição francesa sobre como torturar é uma experiência com muito crédito nos Estados Unidos. Os primeiros formadores da Escola das Américas – escola organizada pela CIA para torcionários de regimes amigos da América Latina – foram veteranos franceses da guerra da Argélia. O livro do Coronel francês Roger Trinquier, “La Guerre Moderne”, que explica pormenorizadamente a necessidade de utilizar a tortura para obter informações, e sobretudo para aterrorizar e humilhar a população civil, era leitura obrigatória dos comandos militares no Vietname. São os militares franceses que primeiro teorizam, de uma forma democrática, o número de civis, por baixa militar do ocupante que é necessário matar para garantir o domínio de um território. A investigação dos altos-comandos franceses dá-se na ressaca da derrota na Indochina francesa.
O filme do realizador Gillo Pontecorvo tem como fio condutor a história de militantes da Frente de Libertação Nacional (FLN), Ali-la-Pointe e seus companheiros que resistem na Casbah, o maior bairro popular da capital Argel, entre 1954 e 1957. Toda a acção centra-se num militar e ex-resistente aos Nazis, o coronel Mathieu (inspirado no coronel Jacques Massu – “o carrasco de Argel”), que utiliza e defende abertamente a tortura para desbaratar a resistência argelina e manter o país sob domínio dos franceses. O filme é de tal forma realista que esteve proibido na Argélia e em França (só exibido em Paris em 1971, tendo o cinema que o passou sofrido um atentado). Nas imagens sucedem-se cenas de tortura e ataques bombistas a militares e população francesa. A certa altura, é detido um líder da FLN argelina e exibido numa conferência de imprensa. Quando um jornalista francês lhe pergunta se “não tem vergonha de usar as mulheres argelinas para transportar bombas para fazerem atentados terroristas”, o nacionalista responde: “vocês bombardeiam as nossas aldeias com os vossos aviões, se querem trocar os cestos das nossas mulheres pelos vossos bombardeiros, nós trocamos imediatamente”.
Até ao fim do filme, o núcleo da FLN na Casbah é totalmente liquidado. No entanto, as manifestações aumentam, a revolta floresce e os franceses, depois de matarem mais de um milhão de argelinos, são obrigados a sair da Argélia.
Em tempos de “guerra ao terrorismo” e de defesa da tortura legalizada, este filme de Gillo Pontecorvo obriga-nos a pensar.
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