O último filme de Steven Spielberg, War Horse, tem como principal protagonista um cavalo. Faz uso da linha narrativa do personagem que face à s contrariedades é capaz de mostrar o seu valor e vencer a condições adversas. Essa personagem é a a famÃlia pobre inglesa que aposta tudo na compra do cavalo, e consegue demonstrar o seu valor para lavrar um terreno. Mas a personagem é também o cavalo, que vai mudando de dono, ou acompanhante, ao longo do filme. Na tradição de Hollywood, o cavalo, depois de variadas peripécias, tendo como pano de fundo a Primeira Guerra Mundial (WWI), volta milagrosamente ao seu primeiro treinador e companheiro.
Tendo como pano de fundo a WWI, ilustra algo do tragicamente ridÃculo do inÃcio da guerra no seu confronto entre duas eras tecnológicas incompatÃveis. A cavalaria era o expoente máximo do assalto terrestre no século XIX, e o cavalo de guerra uma das cobiçadas armas de guerra. O seu anacronismo na WWI é demonstrado numa das primeiras cenas de batalha entre a cavalaria inglesa e um campo alemão preparado com metralhadoras. O cavalo rapidamente deixa a sua função mais nobre para funcionar apenas como animal de carga, para puxar artilharia pesada. Para dar apenas mais um exemplo destes anacronismos: no pré-guerra, enquanto exércitos de outros paÃses adoptavam uniformes castanhos e cinzentos que ofereciam melhor camuflagem, as forças armadas franceses insistiam em preservar o seu uniforme tricolor, um verdadeiro alvo iluminado nos campos de batalha. O filme ilustra também um pouco o horror da guerra das trincheiras, as apocalÃpticas terras-de-ninguém, e as absurdas incursões de infantaria para fora das trincheiras no vã tentativa de avançar a frente mais uns metros.
No meio desta loucura, houve também momentos de grande humanidade. O filme ilustra estes rasgos quando o cavalo foge para a terra de ninguém, na batalha do Somme, e acaba por ficar imobilizado, envolto em arame farpado. Os soldados ingleses, por um lado, e os alemães, por outro, esquecem-se de todo o cenário de guerra e focam as suas atenções sobre o cavalo, tentando atrair a sua atenção com assobios. A razão da guerra, em si fugaz, é esquecida por todos. Um soldado inglês vai então, sob a fraca cobertura de uma bandeira branca, para a zona de ninguém, tentar libertar o cavalo. Um soldado alemão vem juntar-se a ele, com um corta arames, e juntos, entre conversa de camaradas, conseguem fraternalmente libertar o cavalo. De forma cavalheiresca, determinam com uma moeda ao ar quem leva o cavalo já liberto.
A cena recorda a situação verÃdica encapsulada no filme Joyeux Noël, no qual soldados Franceses, Escoceses e Alemães esquecem os conflitos ditados pelos seus superiores e confraternizam na terra de ninguém a primeira noite de Natal da guerra, cantando juntos, jogando futebol, e partilhando a sua humanidade comum. Trágico foi esses mesmos soldados, meses antes operários, artesãos, e agricultores, se terem deixado levar pelas ondas de nacionalismo em vez das vozes que clamavam pela unidade de todos os trabalhadores e apontavam o imperialismo – contrário aos seus interesses de classe – como o verdadeiro motor da guerra.
Obrigado 🙂
… pelo relembrar do que tão facilmente se tende a relativizar, apesar do seu supremo significado…
Um abraço…
Obrigado por me lembrar do filme! No momento que a cena do Arame começou veio esse trailer que vi a muito tempo.
http://www.youtube.com/watch?v=NXcseNVZGRM
Abraços.
Concordo com tudo, com o que dizes sobre o filme (algumas semelhanças com a minha crÃtica: http://5dias.net/2012/02/25/cavalo-de-guerra-de-steven-spielberg/) e com a reflexão que fazes a partir dele .
A cena do arame é brutal e também me remeteu de imediato para o “Feliz Natal”, que é, a propósito, um filme muito, muito bonito e comovente
Fiquei com vontade de ver o(s) filme(s).