Não gosto do IKEA, nunca gostei. Primeiro, porque o designex democrático que lá se vende é uma foleirada, e ir lá fazer compras um tormento, superior a ir comprar trapinhos com a minha filha. Segundo, porque me irrita o ar bonzinho daquela gente, hipócrita como os nórdicos sempre são, a mostrar os maridos na cozinha a ajudar, quando eles estão bêbados de tanta aquavit, a bater nas mulheres e a traumatizar as crianças. Agora o catálogo 2008 do IKEA oferece-me uma terceira razão para não gostar deles – filosófica, desta vez. A capa diz assim: “A nossa casa é o lugar mais importante do mundo” – o que, pirosice à parte, é uma perturbadora afirmação da hegemonia do value pluralism na sociedade portuguesa moderna. Eu não contesto que cada um goste da sua casa (eu gosto da minha), mas contesto que cada um ache a sua casa o sítio entre todos mais importante do mundo e que haja em Portugal dez milhões (ou dois ou três, se fizermos a conta aos fogos e não aos habitantes) de concepções diferentes sobre qual o lugar mais importante do mundo. Quando em Portugal ainda havia valores, os católicos deviam achar que o lugar mais importante do mundo era Roma, os descrentes podiam julgar que era antes outra coisa qualquer – do mausoléu de Lénine à taberna da esquina, as variações eram múltiplas – e até podia haver quem achasse que era a sua própria casa. Entre todos eles, tinha de haver tolerância, condição da paz civil; agora não havia era esta falta de ambição, este umbiguismo, este fechamento sobre si que implica não conceber um lugar no mundo mais importante do que o seu petit prè carré. Se a casa de cada um é, de facto, o lugar mais importante do mundo, se essa convicção íntima é por definição insusceptível de ser objecto de proselitismo ou de partilha, isso quer dizer que no mundo, por haver tantos lugares importantes, não há nenhum que o possa realmente ser. E assim, ninguém ambicionará a mais do que ter uma casa cheia de tralha do IKEA.
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