A semana passada foi marcada pela discussão em torno da produção de alimentos transgénicos em solo nacional, motivada pela actuação de um grupo de manifestantes numa herdade em Silves – apelidados por alguns de «ecoterroristas» e por outros (caso de Miguel Portas, que depois se retratou) de saudáveis alertas à opinião pública. Sobre os transgénicos, tenho dúvidas. Que se estendem à produção alimentar em geral. Quase me apetece desconhecer o que por aí se faz, em nome do descanso mental. Naturalmente, isso é impossível.
Quanto à invasão de Silves, não tenho dúvida alguma: não há qualquer justificação que fundamente a atitude dos «ecomanifestantes», que depressa e transgenicamente se converteram em «ecodestruidores». Gostemos ou não da produção de alimentos transgénicos, o agricultor de Silves cultiva a coberto da lei e nenhum direito assiste ou estava a ser protegidos pelos manifestantes. Como diz o outro, têm direito à indignação, lá isso têm. Mas indignarem-se é uma coisa, ceifarem milho fora de época e de direito é outra.
Confesso que transferi rapidamente a reflexão para manifestações mais mundanas – infelizmente – de «transgenia»: veio-me à cabeça o pneu de Sarkozy, revelado em todo o seu esplendor enquanto remava nas férias norte-americanas e quase geneticamente modificado pela Paris Match. Não foi fruto da engenharia genética e da moderna biotecnologia, não houve quebra e reprogramação de DNA pela transferência de genes de uma espécie para outra, mas quase. Tal como sucede em relação a todos os organismos geneticamente modificados, a modificação depressa veio a lume.
Ora, e que mal é que tem que o Presidente francês queria aparecer aos olhos do mundo atlético e elegante? Ou que a Paris Match queira revelar esse Sarkozy ao planeta? Mal algum, não se desse o caso de a campanha eleitoral francesa ter-se concentrado na aparência dos candidatos, e o regido de Nicola Sarkozy na elegância musculada do próprio, da sua Cécilia e da sua família tão à medida do século XXI. Neste caso, a reprogramação da silhueta presidencial gaulesa pela Paris Match escapa completamente à ética e à legalidade democrática.
A «reprogramação genética» da aparência já foi abundantemente utilizada por líderes e chefes de Estado. Felipe Gonzáles estava «retocado» nos cartazes que anunciavam a sua última candidatura legislativa espanhola; a Tony Blair foram retiradas as marcas de dez anos em Downing Street. Podemos questionar a bondade destas «quebras de verdade» em obediência aos ditames estéticos da sociedade contemporânea, quando se trate de «reprogramações genéticas» levadas a cabo pelos partidos políticos e seus candidatos. Mas quando a quebra de DNA é introduzida e apresentada à opinião pública pela comunicação social – e não foi apenas Sarkozy; a Angela Merkle, por exemplo, foi retirada uma antipática mancha de suor, que reluzia em toda a sua magnificência aquando de um aceno da Chanceler à população – é vital questionar a real intenção dos media. É simpatia? Foi a pedido? E até que ponto estas «mutações genético-aparentes» influenciam o eleitorado?
O Fotoshop é a derradeira ferramenta da engenharia política. Se os transgénicos são a resposta da engenharia genética às necessidades mundiais de alimentos, até que ponto a «transgenia» é a resposta dos eleitos à sociedade que gerem, lideram e representam? Seremos nós consumidores de transgénicos ou «ecomanifestantes»? Julgo que a primeira… Rendendo homenagem à lei do mercado, a oferta só vem surgindo a pedido da procura.
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